O Dia Nacional de Combate ao Bullying e à Violência na Escola foi lembrado em 7 de abril. É tema indispensável nos dias atuais, devido à grande exposição dos adolescentes à internet e às suas diversas redes sociais, jogos e aplicativos, que podem incidir diretamente no aumento de casos de bullying e cyberbulling. Considerando que cada vez mais cedo esses adolescentes estão na rede, mais cedo sofrem com divulgação de fotos, deboches, comentários e isto até mesmo de desconhecidos.
A data também se torna importante em tempos onde a adolescência, considerada uma fase intensa e confusa, tem levado muitos jovens a uma profunda solidão. A nova minissérie da Netflix, “Adolescência”, mergulha nessa realidade com uma narrativa impactante, inspirada em fatos reais. A obra acompanha Jamie, um menino de 13 anos, que é preso sob acusação de assassinar uma colega de escola. Mais do que um drama policial, a série é um retrato cru e sensível da dor adolescente.
O delegado Eduardo Kruger, titular da Delegacia da Mulher e do Adolescente, entende que há um aparente aumento dos casos de bullying e cyberbulling, que se tornaram mais evidentes e facilitaram a produção de provas, com a gravação dos vídeos ou prints das condutas inapropriadas, diferentemente do que ocorria antes da exposição dos adolescente à internet e às redes sociais, contudo, não há como se afirmar que aumentou o número de casos, já que, antes desta exposição, o bullying era comum, porém pouco divulgado.
“As modificações causadas pela evolução tecnológica nos últimos anos tornaram impossível para as pessoas, acompanhar tudo que vem mudando no mundo em qualquer área, inclusive no que diz respeito à maneira como os adolescentes vêm usando as redes sociais hoje, que certamente será diferente da maneira como a utilizarão daqui um ano. Então, a forma como vivemos em sociedade mudou e precisamos nos acostumar com essa nova realidade, sempre buscando nos atualizar”, afirma o delegado.
Sobre um dos pontos da trama da minissérie “Adolescência”, que trata da exclusão do personagem principal em relação a outros estudantes, Dr Eduardo acredita que a necessidade de pertencimento a um grupo social é intrínseca aos seres humanos, e mais acentuada na juventude. “Desta forma, é natural que os indivíduos que se sentem excluídos busquem outros grupos que os aceitem, e, infelizmente, grupos com propósitos deletérios tem uma maior abertura para acolher essas pessoas”, ilustra.
O delegado também acredita que a maioria das escolas ainda não se adaptou as evoluções tecnológicas, e às mudanças que elas causaram na sociedade. Os jovens de hoje não são os mesmos que os da geração anterior. Fazer com que os adolescentes fiquem de 04 a 05 horas sentados em uma cadeira ouvindo um adulto falar sobre assuntos muitas vezes não interessantes e que podem ser conhecidos com apenas alguns cliques na internet, torna o ambiente escolar um local em que os adolescentes não desejam estar, e, portanto, não há um incentivo para que haja uma socialização entre os alunos. “Como diz o ditado, ‘não existe uma solução fácil para um problema difícil’, contudo, acredito que a sociedade já evoluiu no tema do bullying, ao expô-lo e debatê-lo por alguns anos, e o mesmo ocorrerá com o cyberbullying”, pontua.
Nesse contexto, o papel da Delegacia do Adolescente é interferir nos casos que devem ser considerados graves. “Trazer todos os casos para a esfera do direito penal e esperar que o problema seja solucionado é uma ilusão, pois é preciso expor o tema e debatê-lo em toda a sociedade para que possamos achar uma solução para ele”, afirma.
ESCUTEM SEUS FILHOS(AS)!
A conselheira tutelar Patrícia Soares acredita que a exposição prolongada e desassistida dos jovens à internet tem contribuído para o aumento de casos de bullying e, principalmente, de cyberbullying. Isso porque o ambiente online facilita o anonimato e a impunidade, além de prolongar a permanência das agressões, o que torna o impacto emocional mais profundo nas vítimas.
“O tema é relativamente novo e vem evoluindo muito rápido. A linguagem, os códigos e os comportamentos que circulam nas redes sociais são dinâmicos, e muitas vezes as famílias e as autoridades não conseguem acompanhar essas mudanças. Isso gera dificuldade de compreensão, prevenção e o enfrentamento de problemas como o cyberbullying e a radicalização online. A exclusão social e a sensação de não pertencimento também fazem com que os adolescentes vulneráveis busquem aceitação em outros grupos. Na internet, os grupos violentos oferecem um falso sentimento de acolhimento e identidade, criando uma bolha em torno desses adolescentes, fazendo com que eles se sintam ouvidos, valorizados e dependentes, facilmente influenciados por discursos de ódio e violência”, alerta a conselheira.
De acordo com ela, quando a escola não é um ambiente acolhedor e respeitoso, ela se torna o principal cenário para o bullying. A falta de diálogo, empatia e ações de inclusão favorecem a fomentação de comportamentos agressivos. “Adolescente que já se sente excluído ou diferente se torna alvo fácil e pode internalizar essa violência, gerando problemas emocionais ou se aproximando de grupos que ofereçam atenção misturada ao ódio. É importante ressaltar que quem faz a escola são os alunos, os professores e as famílias, logo, promover um ambiente acolhedor e respeitoso é responsabilidade de todos”, aconselha.
Como cessar isso? Patrícia lembra que é um trabalho coletivo. A sociedade, família, escola e instituições precisam estar atentos e comprometidos com a educação digital, o respeito à diversidade e a promoção de ambientes seguros. Não compartilhar e denunciar qualquer tipo de conteúdo relacionado é fundamental para que os agressores e estes grupos violentos sejam alcançados pela Lei. A regulamentação das mídias também é necessária para garantir a proteção de crianças e adolescentes na internet.
“Quanto ao papel do Conselho Tutelar, o órgão tem a função de zelar pelos direitos das crianças e adolescentes. Quando recebemos denúncias de casos de bullying e cyberbullying, realizamos orientação para as famílias, encaminhamos para os serviços de Proteção, podemos encaminhar o caso ao Ministério Público ou demais órgãos que compõe o Sistema de Garantia de Direitos. Temos realizado ações de conscientização nas escolas, comunidades, indústrias, igrejas, em geral com o intuito de levar o máximo de informação para as pessoas. Somente com informação é possível garantir a proteção das crianças e adolescentes”, adverte.
Patrícia ainda reforça a necessidade de se escutar mais os adolescentes, já que muitos jovens enfrentam esses problemas em silêncio, por medo ou vergonha. “Em todas as oportunidades que tenho para falar com os responsáveis, peço que eles tenham tempo de qualidade com seus adolescentes, desconectem-se do mundo externo e virtual para conectar-se aos seus, só assim é possível observá-los e compreendê-los. Criar espaços seguros de diálogo nas famílias, nas escolas e até nas redes sociais é fundamental. Além disso, a educação emocional e digital precisa ser parte da formação desde cedo, para que esses adolescentes estejam mais preparados para lidar com os desafios do mundo virtual e real”.
A LINGUAGEM DOS EMOJIS
A minissérie “Adolescência” também faz uso de muitos emojis, mas você sabe o que eles significam? À primeira vista, parecem inofensivos, mas no contexto da cultura digital e de fóruns incel, esses símbolos podem carregar mensagens de exclusão, ódio e bullying disfarçado.

Edição n.º 1460.