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Nas procissões os fiéis costumam carregar a imagem do santo de sua veneração em uma espécie de padiola decorada que é denominada andor. É impossível desconhecer que parcela significativa da população não compartilha a crença na benéfica intercessão dos santos, mas não é este o aspecto que quero destacar. Todo o vivente com existência consciente é, ou deveria ser, ciente da angústia que envolve a condição humana e seu desamparo. A pessoa de boa fé e com raciocínio inteligente sabe que nossas certezas podem se esvair por completo a qualquer momento. Assim, o respeito a fé professada pelo seu semelhante que acredita, ou não, no poder dos santos representa a evolução positiva de quem o demonstra. O ditado popular “Devagar com o andor que o Santo é de barro” significa que deve-se ter cautela e calma ao fazer ou falar algo para evitar-se as consequências desastrosas de uma procissão em desatinada carreira. Não é a primeira vez que manifesto minha preocupação com o acirramento dos ânimos que marca a atual crise política brasileira. Volto ao tema porque aumenta cada vez mais a tensão dos posicionamentos frente aos acontecimentos políticos da atualidade brasileira. Familiares rompem relações, vizinhos e colegas de trabalho deixam de conversar entre si e a opinião diferente é combatida não mais com argumentos, mas com a agressão destinada a abafar a discordância. Causa tristeza e preocupação ver pessoas que eu considerava equilibradas desejarem a eliminação de seus oponentes pela força de cânceres, por linchamentos físicos e morais ou por outros meios igualmente violentos. Parece que boa parte de nós esqueceu-se da evolução que tivemos com a abolição da escravatura, com a democratização da educação e outros avanços sociais que engrandeceram a nação brasileira e que foram conquistados em clima de relativa paz. Mais recentemente, o retorno à normalidade depois de duas décadas de ditadura militar e a vigência da democracia permitiu expressarmos livremente nossas opiniões. A escravidão, a ditadura e os males que causaram à sociedade brasileira devem ser lembrados para que não desprezemos a liberdade democrática e a vigência de direitos plenos e universais a todos. Como explicar que uma médica pediatra deixe de atender um inocente bebê porque seus pais tem uma posição política oposta à sua? E o que dizer de um professor que ameaça fisicamente seus alunos por defenderem uma proposta que ele considera antidemocrática? A única resposta que surge é a predominância da ignorância, da intolerância e do atraso. É hora de termos cautela e cuidarmos de nossa jovem democracia para que deixemos um país melhor aos que virão depois de nós. Respeitar as leis e não querer mudar as coisas no grito é pressuposto básico de uma sociedade que se pretenda justa. Conviver e aceitar as divergências é indispensável à evolução. Concluo deixando uma citação de Jean Paul Sartre, pensador que mesmo declarando-se agnóstico tem o respeito das pessoas conscientes: “Viver é isso: Ficar se equilibrando o tempo todo, entre escolhas e consequências.”.

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