Médico da Prefeitura não aceita tomar a vacina e vai à Justiça para não voltar ao trabalho presencial porque não foi imunizado
Decisão da Justiça de Araucária é do dia 5 de maio e indeferiu o pedido do médico para que não tivesse que voltar ao trabalho presencial

Uma situação no mínimo curiosa envolvendo um funcionário da Prefeitura que não atendeu ao chamado de sua chefia para retornar ao trabalho presencial foi parar na Justiça nas últimas semanas.

Roberto Hiroshi Kawabata é médico pediatra concursado da Prefeitura de Araucária desde o ano de 2001. Ele tem 59 anos. Ou seja, não é idoso, mas pertenceria ao grupo de risco por ser hipertenso. Em razão disso, praticamente desde o início do estado de calamidade causado pela pandemia da Covid-19, em março do ano passado, estava em trabalho remoto, atendendo aos seus jovens pacientes de maneira virtual.

Em janeiro deste ano, com o início da vacinação contra a Covid-19 dos profissionais de saúde, o pediatra foi convocado pela Secretaria Municipal de Saúde (SMSA) para receber a imunização. Estranhamente, porém, ele não atendeu ao chamado e, vejam só, alegou que sua vacinação seria ilegal porque estaria em trabalho remoto, o que – em seu entendimento – não o tornaria um trabalhador prioritário para receber a agulhada que bilhões e bilhões de pessoas no mundo desejam neste momento.

A argumentação de Kawabata foi analisada pelos órgãos técnicos da Prefeitura, que entenderam que ele era sim pertencente ao grupo prioritário para receber a vacina, já que é profissional de saúde. Mesmo sabendo do posicionamento da Secretaria de Saúde, ele não apareceu para receber a imunização. Lotado na Unidade Básica de Saúde da Fazendinha, área rural de Araucária, o pediatra seguiu em trabalho remoto, atendendo aos seus pacientes (crianças de zero a doze anos) de forma remota.

A história teve um novo capítulo em março, quando o prefeito Hissam Hussein Dehaini (Cidadania), que é idoso, pertencente ao grupo de risco e que estava trabalhando de maneira presencial, editou um decreto determinando que todos os profissionais de saúde que já tivessem tido acesso a vacina retornassem ao trabalho presencial. Com base nessa nova normativa, Kawabata foi convocado voltar a dar expediente de maneira presencial na comunidade rural da Fazendinha. Ele, porém, não o fez.

Como não apareceu para trabalhar, e com base parecer da Procuradoria Geral do Município (PGM), a Secretaria de Saúde o notificou de que a recusa em retornar ao presencial poderia acarretar abandono de emprego.

Ainda inconformado, Kawabata apelou ao Poder Judiciário. Entrou com uma ação do tipo Mandado de Segurança para que pudesse continuar em trabalho remoto. O caso foi analisado pela 2ª Vara da Fazenda Pública de Araucária.
No pedido que fez ao Judiciário, o pediatra argumentou que o “retorno ao trabalho de forma presencial, não vem a constituir num ato de insubordinação e abandono do serviço, mas sim, na luta contra o contágio nesta fase crítica da doença, restringindo assim os outros direitos temporariamente”.

Na análise do pedido, a juíza Sandra Dal’ Molin pontuou que “não se ignora o fato de o impetrante compor o chamado “grupo de risco”. Contudo, in há risco de dano reverso, uma vez que eventual afastamento do impetrante casu pode prejudicar a continuidade e qualidade da prestação de serviço público de saúde, atividade considerada essencial e cujo funcionamento deve ser resguardado na crise atual”.

Posteriormente, ela escreveu que não pode o Poder Judiciário atuar na contramão da necessidade de que os profissionais de saúde trabalhem presencialmente no enfrentamento da pandemia junto aos serviços de saúde, autorizando o afastamento de servidores experientes e aptos, o que causaria evidente prejuízo a coletividade.

Por fim, ao negar o pedido de Kawabata, a juíza não deixou de acrescentar a conduta contraditória do pediatra que não quer voltar ao trabalho presencial por não ter sido vacinado, mas – ao mesmo tempo – recusa o chamamento para se vacinar. “Assim, presumida a existência de interesse público na manutenção do servidor em suas atividades, tem-se, num juízo de cognição sumária, por regular o ato praticado pelo impetrado, mormente diante da conduta contraditória do impetrante que invoca a necessidade da vacina para o retorno da sua atuação presencial, a qual, contudo, se recusou a receber”.

O Popular procurou o médico para ouvir por quais motivos não tomou a vacina e seguiria insistindo em não retornar ao trabalho presencial.

Ele disse que só pretende voltar ao atendimento presencial em 13 de agosto. “Após 14 dias da segunda dose da vacina da Pfizer, que tomei por Curitiba. Sempre dentro da lei. Nosso Município tem a 6ª taxa de contagiosidade do Paraná. E com a taxa de mortalidade aumentando é necessário proteger as famílias”, disse.

Questionado sobre a existência de alguma motivação específica para não ter tomado a Coronavac quando foi convocado pela direção da SMSA, ele insistiu que tomar a vacina naquela oportunidade o tornaria um “fura-fila”. “No momento da convocação para vacina eu estava em trabalho remoto. O grupo do trabalho remoto não era do grupo prioritário. Assim se tomasse naquele momento seria um crime de fura-fila. E como médico que sou não poderia jurar ignorância. Estaria fora da lei. Precisamos estar dentro da lei para ter liberdade”, acrescentou.

Perguntamos então se ele, enquanto cumpridor de leis, não acataria agora a determinação da Secretaria de Saúde de retornar ao trabalho presencial, já que o Poder Judiciário, a quem cabe dirimir eventuais conflitos de interpretações de direitos, já se manifestou dizendo ser legal a determinação da Prefeitura para que ele retorne fisicamente ao trabalho. Ele não respondeu ao questionamento e emendou: “Meu trabalho remoto é mais eficaz e mais eficiente do que o presencial neste momento”, finalizou.

Texto: Waldiclei Barboza

Publicado na edição 1264 – 02/06/2021