Muitas questões jurídicas precisaram e precisarão, ainda, ser revistas por força da pandemia. Mas a questão voltada ao pagamento da pensão alimentícia, e o seu não pagamento pode ensejar prisão nesses tempos de total dificuldades a muitos?
Em março do corrente ano, o Conselho Nacional de Justiça recomendou aos juízes que considerassem a colocação em prisão domiciliar das pessoas presas por dívida alimentícia, com vistas à redução dos riscos e em respeito ao contexto social de disseminação do vírus.
Tal recomendação foi, posteriormente, determinada pela Lei nº 14.010/2020, como se nota da redação literal do Art. 15:
Art. 15 – Até 30 de outubro de 2020, a prisão civil por dívida alimentícia, prevista no art. 528, § 3º e seguintes do Código de Processo Civil, deverá ser cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar, sem prejuízo da exigibilidade das respectivas obrigações.
Ocorre que, a transformação da prisão em regime fechado em prisão domiciliar nesses casos, não tem o caráter coercitivo necessário para coibir o devedor ao pagamento.
Bom, o entendimento que prevalece atualmente é que, no âmbito dos alimentos, todas as medidas previstas em lei para a efetivação do recebimento do crédito alimentar (como a prisão civil do devedor) são rol meramente exemplificativo, ou seja, admite-se outras medidas atípicas mencionadas no Art. 139 do CPC. Vejamos:
Art. 139: “o juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: (…) IV – determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”.
A despeito dessa possibilidade, há importantes precedentes de Tribunais Superiores que afirmam que o CPC/2015 tratou a satisfação de um direito como norma fundamental do processo civil e isso permite que o juiz adote todas as medidas indutivas e coercitivas para assegurar o cumprimento de uma ordem judicial, conferindo ao magistrado um poder geral amplo de efetivação.
Em que pese existam decisões de Tribunais Superiores em contrário, há entendimentos de que, se é possível medida mais gravosa (como a prisão civil em regime fechado no caso dos alimentos familiares), é possível medidas atípicas que se demonstrem mais coercitivas no caso concreto, como a apreensão de documentos e a consequente restrição de direitos do devedor, o que na verdade é medida até menos incômoda e uma alternativa à restrição da liberdade, devendo ser buscada durante a pandemia do COVID-19.
Em conclusão, não há obstáculos para que medidas alternativas de coerção, como apreensão de passaporte e carteira de motorista do devedor de alimentos, sejam tomadas quando necessário em casos específicos, observando-se as orientações da decisão do STJ.
Publicado na edição 1225 – 13/08/2020