Diante das exigências do seguimento proposto por Jesus, um dos seus discípulos manifesta a sua preocupação: ‘Então são poucos os que se salvam’. Jesus não responde nem sim e nem não, simplesmente pede para entrar pela porta estreita. Não dá muitas pistas sobre o que isto significa, mas, a partir das suas palavras, gestos e ações, nós podemos encontrar algumas indicações e luzes sobre o significado desta proposta de Jesus.
Partindo da porta larga, claramente compreendemos que é a porta das facilidades, dos prazeres, do mundo material, do egoísmo e do individualismo. Muitos pregam um prazer sem medidas, aproveitar a vida, curtir cada momento, mas sem nenhum compromisso com o outro. É um estar totalmente voltado para aquilo que lhe convém, para as suas vantagens pessoais, para seus prazeres momentâneos, guiados pelos instintos e não pela consciência. Muita gente prega este tipo de vida, como se ela fosse satisfazer plenamente o ser humano. E o que vemos, na verdade, é um grande vazio que advém logo depois. Porque isso realmente não preenche as necessidades fundamentais, pelo contrário, gera mais vazio ainda.
A porta estreita é a porta das exigências, dos sacrifícios, de uma vida disciplinada e voltada para o outro. Quando Pedro questiona Jesus sobre aquilo que vão receber como prêmio pelo fato de terem largado tudo para segui-lo, ele não oferece nada de cômodo e tranquilo. Simplesmente diz a eles que receberão neste mundo amigos, casas, famílias e mais a eternidade. E isso é bem verdade, pois, na medida em que alguém se dispõe a trabalhar em comunidade e colocar seu tempo a serviço do próximo, vai encontrando tantos e tantos amigos no meio do caminho. São amigos pela fé, que vão criando vínculos e dando significado mais profundo para a sua existência.
Colocar a sua vida a serviço dos outros, é realmente muito exigente e requer sacrifícios. Tantas vezes faz-se necessário deixar de lado momentos prazerosos, lúdicos, para ir ao encontro do outro, das suas necessidades. Quem trabalha em comunidade, como coordenador de alguma pastoral ou como membro dela, sabe o quanto é exigente servir à comunidade. Quantos sacrifícios, mas, ele experimenta bem lá no fundo, a verdadeira alegria. A alegria que vem do evangelho, que nos envia a servir em vez de ser servido, a ajudar em vez de ser ajudado, a amar em vez de ser amado.
Entrar pela porta estreita não significa sofrimento, dor, peso, como se fosse algo que não nos realiza e não nos preenche como seres humanos. Muito pelo contrário, pois, na medida em que servimos, nos doamos, colocamos a nossa vida a serviço dos outros, da comunidade, recebemos o cêntuplo neste mundo, mais a eternidade. É algo que nos realiza profundamente, como dizia São Paulo: ‘existe muito mais alegria em dar do que receber’.
Num mundo tão marcado pelo egoísmo, pelo individualismo, pela indiferença, pela ganância, o evangelho continua sendo o caminho, a resposta para nossas vidas. Se Jesus nos convida a entrar pela porta estreita, pela porta do amor, da doação, do bem, da ajuda, da colaboração, da partilha, da vida em comunidade, é porque, somente agindo assim encontraremos o sentido e a razão profunda da nossa existência. Entrar pela porta estreita é fazer a experiência da verdadeira felicidade, que exige sacrifícios, disciplina, não para o nosso mal, sofrimento e frustração, mas para a nossa plena realização como seres humanos.
Publicado na edição 1177 – 22/08/2019