O Rio Grande do Sul vive a sua piora tragédia climática. A chuva que persiste há mais de uma semana deixou 435 de 497 municípios alagados, causando mortes e prejuízos incalculáveis. Mas a catástrofe é resultado de alguns fenômenos que afetam a região e que foram agravados pelas mudanças no clima. A capital gaúcha Porto Alegre, por exemplo, seria o ponto chave para entender o acúmulo de água que causa enchentes na região metropolitana do estado. Em um cenário de chuvas intensas e constantes há mais de 10 dias, o lago Guaíba bateu a máxima histórica de mais de 5 metros e deve permanecer acima da cota de inundação (3 m) nos próximos dias.
Juntamente com o relevo da capital, também contribuíram para a gravidade do cenário a formação topográfica das regiões no entorno da região metropolitana, a bacia hidrográfica da área e o efeito das tempestades no Oceano Atlântico. A velocidade das águas ajuda o Guaíba a desaguar na Lagoa dos Patos e seguir fluxo para o mar, porém por conta da intensidade das chuvas, o lago está recebendo mais água do que o normal, ultrapassando sua cota de inundação. O escoamento é dificultado pelo alto volume de água e pela estreita passagem da Lagoa dos Patos ao Oceano.
Trazendo a situação para uma realidade local, Araucária também possui duas barragens, do Passaúna e do Rio Verde, que integram seu quadro geográfico. Por isso, o Município se adequou à Lei Federal n° 12.334/2010 (que define responsáveis e ações a serem adotadas em caso de emergência nas barragens), e elaborou seu Plano de Contingência Municipal.
Através desse Plano, é possível planejar e executar exercícios de simulados, preparando a população e todos os envolvidos, caso ocorra futuramente alguma emergência. O plano deve levar em conta dados como área de impacto potencial, população vulnerável, planejamento para sistemas de monitoramento e alerta, rotas de fuga e pontos de encontro.
No caso da barragem do Rio Verde, a Petrobras, responsável pela área, já iniciou a instalação de sirenes, de placas de sinalização de rotas de fuga, pontos de encontro, assim como também promoveu reuniões com parte da comunidade afetada, falando sobre os procedimentos que devem ser adotados em uma possível situação de rompimento.
Com relação a barragem do Passaúna, já existe um trabalho no sentido de garantir a instalação de sirenes, placas de sinalização, dentre outros, por parte do empreendedor (Sanepar). “Cada barragem possui um Plano de contingência Municipal próprio, assim como o Plano de Ação Emergencial- PAE. Dentre as ações de prevenção da Coordenadoria de Defesa Civil, cito as vistorias em residências, por problemas estruturais, a fim de identificar patologias, assim como realizar as orientações cabíveis aos moradores e também, se necessário, a interdição do imóvel, incluindo as vistorias de árvores com risco de queda em residências. Ambos os serviços visam salvaguardar a vida do cidadão araucariense”, diz o coordenador técnico da Defesa Civil Municipal, Dirley Tokarski Borges.
A engenheira ambiental da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Andressa Dutra, descreve que a área urbana de Araucária é cercada pelos rios Passaúna, Barigui e Iguaçu, e que este último registrou o maior aumento do nível do rio em 1983. “Foi uma cheia histórica, e é por isso que como prevenção, por força da legislação de Zoneamento Urbano, alguns locais foram delimitados por áreas de fragilidade ambiental, com alto risco de alagamentos, não sendo adequados para ocupação intensiva, para novos parcelamentos do solo ou adensamento urbano. O Município realiza a gestão das aprovações de novas edificações nesses locais, contudo, muitas pessoas ainda constroem irregularmente nessas áreas em que há a possibilidade de recorrência de cheias”, afirma.
A engenheira completa que quando nos referimos a cotas de inundação, basicamente estamos falando de um mapa onde as áreas mais baixas da cidade (abaixo da cota de inundação de 1983) estão sinalizadas. “A legislação hoje restringe e controle do uso e da ocupação em áreas inaptas, com destaque para as áreas acometidas pela cota de inundação do Rio Iguaçu. Lembrando que Araucária tem muitas áreas nessa situação, a exemplo dos bairros Campina da Barra, Costeira, Iguaçu, Porto das Laranjeiras, Centro e na Sede do Distrito de Guajuvira”, ilustra.
Ainda de acordo com Andressa, quando realizado o adequado Alvará de Construção e Licença Ambiental das construções, todas essas questões são vistas, porém o problema está nas edificações não formalizadas (nesse caso, as moradias construídas em áreas de ocupações irregulares). Em Araucária, ela cita como os maiores riscos os bairros perto do Rio Passaúna, que frequentemente sofrem com alagamentos.
“Temos casos de alagamentos também no Rio Chimbituva e São Patrício, que abrangem o Centro e os bairros Tindiquera e Iguaçu. Então, para evitar que inundações semelhantes à do Rio Grande do Sul ocorram por aqui, temos que conhecer as nossas bacias hidrográficas e o fluxo dos nossos rios, investir em educação ambiental, respeitar as taxas de impermeabilização dos lotes descritos na legislação, incentivar a moradia em locais em que não há fragilidade ambiental e, sempre que possível, instalar equipamentos de armazenamento das águas de chuvas”, sugere.