A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal e fixar a quantidade de 40 gramas como referência para diferenciar usuários de traficantes, tem gerado questionamentos, principalmente com relação às abordagens policiais. Primeiramente, temos que entender que os ministros do STF não liberaram ou legalizaram o uso de maconha. O uso pessoal continua sendo um comportamento ilícito, ou seja, ainda é proibido fumar a droga em local público. Portanto, as polícias devem continuar seguindo o mesmo trabalho.

Segundo a advogada Pamela Camargo, especialista em Direito Criminal, o porte e a posse de drogas para consumo próprio são temas controversos no Direito Penal Brasileiro. O artigo 28 da Lei nº 11.343/2006 ainda considera essa conduta como crime, mas sem pena de prisão, aplicando sanções alternativas como advertências ou programas educativos. “A lei não define um limite específico entre o usuário e o traficante, o que gera interpretações diversas, dependendo do contexto da abordagem. A posse ocorre em ambiente privado, enquanto o porte é em locais públicos. O porte é mais suspeito de tráfico, enquanto a posse é geralmente considerada uso pessoal, com sanções mais leves. Recentemente, o STF entendeu que a posse de até 40g de maconha ou o cultivo de até seis plantas fêmeas de Cannabis sativa é presumidamente para consumo pessoal, desde que não haja indícios de tráfico, como balança de precisão ou dinheiro trocado. O STJ tem desclassificado o tráfico para porte quando a quantidade é compatível com uso pessoal e sem sinais de comercialização”, explica.

Segundo a advogada, 0 artigo 33 da Lei de Drogas define o crime de tráfico, abrangendo produção, venda, transporte e fornecimento de entorpecentes, mas não especifica uma quantidade mínima ou máxima para caracterizar o crime. A quantidade apreendida é apenas um dos elementos que o juiz deve considerar para distinguir o tráfico do uso pessoal, podendo a quantidade maior indicar intenção de comercialização. O juiz, com base nas provas e no contexto, também pode avaliar a “quantidade habitual de consumo” para determinar a natureza do crime.

“Mas então, por que ainda vemos pessoas sendo presas com pequenas quantidades de droga? A resposta é que, durante a abordagem, os policiais não têm como saber com certeza se as drogas são para o uso ou para o tráfico. Por isso, mesmo que a quantidade seja pequena, eles costumam conduzir a pessoa até a delegacia para averiguação, onde o delegado vai analisar a situação e decidir se o caso será tratado como porte ou tráfico”, ilustra.

A Guarda Municipal de Araucária reforça que a decisão do STF vale apenas para a maconha, não abrange outras drogas como cocaína, crack, drogas sintéticas e outras. “A GMA continua seu trabalho no combate ao tráfico e mesmo pessoas apreendidas com quantidade igual ou inferior a 40g de maconha, continuam sendo encaminhadas à autoridade policial, que é quem analisa a situação e decide se o caso será tratado como porte ou tráfico”, diz.

O comandante da 2ª Cia da Policia Militar de Araucária, Tenente Francimar, comenta que o fato de o Supremo Tribunal Federal ter estabelecido a quantidade mínima de 40 gramas para constatar que a pessoa é usuária não está interferindo nos encaminhamentos das ocorrências, até porque existe algumas exceções.

“A pessoa pode ser detida com 40 gramas ou menos, mas se ficar caracterizada a traficância, ou seja, se for abordada com vários tabletinhos de maconha, cada um pesando 2 gramas, totalizando por exemplo 30 gramas, e ela também estiver com várias notas trocadas de dinheiro, fica perceptível que não está utilizando a substância para o uso próprio, mas para a traficância. Nesse caso, ela poderá sim responder pelo crime de tráfico de drogas”, exemplifica o Tenente.

Ainda segundo o comandante, quando a pessoa é pega com uma quantidade única dentro dessa margem definida pelo STF, responderá a um termo circunstanciado, que é uma contravenção penal, e será encaminhada para o judiciário, que aplicará as medidas administrativas necessárias, como advertência e inclusão em programas educativos.

DESCRIMINALIZAÇÃO

A advogada Pamela Camargo salienta que com a decisão do STF, deixa de ser considerado crime no Brasil adquirir, guardar, transportar ou portar maconha para consumo pessoal, desde que dentro do limite fixado de 40g ou com até seis plantas fêmeas de maconha. Antes disso, essas condutas estavam previstas no artigo 28 da Lei de Drogas de 2006, que já não previa pena de prisão, mas sim medidas alternativas, como advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade e participação em curso educativo.

“Com a descriminalização, retira-se da lista de punições a prestação de serviços à comunidade, por se tratar de sanção com natureza penal. Além disso, como não haverá mais condenação criminal nesses casos, o usuário não será considerado reincidente, caso venha a praticar outro crime no futuro”, explica.

Edição n.º 1465.