Atos de indisciplina estão se tornando cada vez mais comuns nas escolas. Porém, muitos deles acabam evoluindo para atos infracionais, ou seja, condutas descritas como crimes e tipificadas no Código Penal, só que cometidos por menores de idade.
Conforme explicou a delegada da Delegacia da Mulher e do Adolescente, Hastrit Greipel, uma lesão corporal cometida por pessoa maior de 18 anos é considerada crime; já, se a mesma situação for cometida por menor de idade, entre 12 anos completos e 18 incompletos, é encarada como ato infracional. “Após o registro do boletim de ocorrência, o adolescente, a vítima e eventuais testemunhas são ouvidos na delegacia. Depois disso, é marcada audiência para que este menor converse com o promotor, onde será analisada a melhor opção para aquele indivíduo. O cumprimento de medidas pode depender também se o adolescente for reincidente ou não”, explicou.
O promotor da Vara da Infância e da Juventude, David Kerber de Aguiar, comentou que a maioria dos atos infracionais envolve alunos e poucos são os casos envolvendo alunos e professores. “Observo, inclusive, que a grande parte das situações são provenientes das escolas públicas. É claro que nas escolas particulares os casos também acontecem, mas as instituições, bem como as famílias, acredita-se que melhor estruturadas, podem acabar ‘abafando’ os casos que não chegam até o nosso conhecimento”, disse.
De acordo com David, a promotoria recebe, em média, 4 casos por mês de atos infracionais cometidos em escolas, contando o ano letivo. “Estes casos envolvem lesão corporal, ameaça e agressão verbal. Mas, vale ressaltar que em Araucária, pelo menos desde quando passei a atuar na comarca, nunca tratei de situações envolvendo lesão de aluno contra professor. As brigas acontecem entre alunos, entretanto os casos de injúria são também observados contra os professores”, afirmou.
Ao ser questionado sobre o limite do ato de indisciplina que pode evoluir para um ato infracional, o promotor enfatizou que este limite é o bom senso. “Em nível pedagógico, é melhor pensar na conciliação. Contudo, se há uma eventual ofensa verbal, é necessário entender até que ponto o caso pode ser contornado”, disse. Ele contou também que todos os casos oriundos de escolas que a promotoria recebe, é dado o correto prosseguimento nos trâmites. “O ideal é que a escola tente contornar a situação, afinal, esse é o objetivo da instituição escolar. Mesmo porque, quando o aluno menor vai para a delegacia, acaba sendo marginalizado”, declarou.
Ainda, de acordo com o promotor, cerca de 10% dos casos são reincidentes e há igualdade por gênero, tanto meninas quanto meninos têm sido infratores. A respeito das consequências do ato ao adolescente, podem variar de acordo com a gravidade do caso, sendo que o infrator pode até ser internado. “Se há infração de menor potencial, geralmente a medida será o cumprimento de serviços à comunidade, em locais como CRAS, hospital, entre outras repartições. Ainda, entre as consequências, o menor pode ficar em liberdade assistida, monitorado pelo Centro Operacional de Medidas Socioeducativas (COMSE), até receber advertências e orientações”, apontou.
Por outro lado, o que incomoda o Juízo da Infância e Juventude, é a passividade dos pais em relação ao ato infracional. “Os pais, mesmo reconhecendo que o filho errou, não possuem conduta tão ativa, sendo de deixá-lo de ‘castigo’ ou colocá-lo para estudar”, destacou.
O secretário de educação de Araucária, Henrique Theobald, comentou que a maioria dos casos cometidos por alunos do 1º ao 5º ano passam pelo Conselho Tutelar e resultam em conversa com os pais. Já alguns dos casos mais graves, a maior parte deles cometidos por alunos do 6º ao 9º ano e alunos do ensino médio, enquadram-se em ato infracional.
Vale lembrar que, nem todo ato indisciplinar corresponde a um ato infracional. A indisciplina está apresentada num contexto de desobediência e desrespeito. Já o ato infracional é verificado quando a conduta do infrator é enquadrada como crime ou contravenção penal previsto na legislação.
Henrique, que já foi também professor em escolas municipais, contou que, quando dava aulas, notava mais casos de briga entre alunos, muitos cometidos por bullying. “Os casos mais complicados envolviam meninas e hoje é possível notar um aumento considerável de violência entre as adolescentes. Geralmente, as brigas têm início nas redes sociais e o ‘acerto de contas’ termina na escola”, contou.
Outro ponto observado pelo secretário de educação é que quando os pais chamam a atenção dos filhos a briga termina, porém quando os pais ficam do lado dos filhos a confusão continua.
O Sindicato dos Servidores do Magistério Municipal de Araucária (SISMMAR) concorda que alguns dos atos infracionais nas escolas envolve questões de injúria contra professores e indisciplina por enfrentamento. Aline Unicki, que integra a coordenação do sindicato, comentou que já presenciou até mesmo alguns pais que precisaram ser contidos na sala da direção. “O aluno, muitas vezes, conta a sua versão aos pais, que vão à escola exaltados com a demanda apresentada”, afirmou.
Ela também comentou que nos casos entre alunos e professores, há maior incidência de atos contra professoras. “Isto porque vivemos em uma sociedade acostumada a desrespeitar mulheres”, disse, complementando que o professor é visto como uma extensão da casa e a escola é reflexo do lar.
A representante do SISMMAR indicou que ano após ano a indisciplina nas escolas aumenta e um dos maiores problemas é a falta de conscientização que o espaço da escola e o professor representam na vida dos alunos. “Falta resgatar o valor que a escola tem na vida das crianças e adolescentes e também o valor dos professores em todo este processo”, finalizou.
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