Mulheres que sobreviveram à violência dos companheiros

Foto: Pixabay
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Mulheres que sobreviveram à violência dos companheiros
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C.A.S, empresária, tem 52 anos e foi casada durante quatro anos. Namorou por apenas seis meses e já se casou. “Ele era um cavalheiro, um verdadeiro príncipe, e por um tempo eu tive o melhor marido do mundo. De uma hora pra outra, sem nenhum motivo aparente, ele se tornou agressivo, até que um dia me bateu. O denunciei na Delegacia da Mulher e foi muito constrangedor. A falta de privacidade e de acolhimento me abalaram. Fui fazer o exame de corpo delito no IML, devido às agressões que havia sofrido, e foi outra decepção. Precisei de acompanhamento psicológico”, relembra a empresária.

C.A.S conta que após sofrer a violência justamente por quem jurou amor eterno, ela se tornou uma pessoa amarga, cheia de culpas. “Quando perguntei porque ele tinha mudado, dizia que não se lembrava de nada, se fazia de idiota. Depois descobri que ele já tinha tido problemas com drogas e álcool. Antes de casar eu não investiguei seu passado, acreditei somente no que ele me falava. Então eu digo para as outras mulheres, que mesmo que o homem passe a imagem de bonzinho, é preciso conhecer o seu passado. Acho que meu casamento só durou quatro anos porque meu marido viajava muito, passava a maior parte do tempo fora de casa, ele levava uma vida dupla, tinha outra família, e isso eu também só descobri mais tarde. Sou formada em Enfermagem, já vi muitas mulheres vítimas de violência doméstica serem agredidas e vi que as agressões não ficaram apenas na primeira briga, eu não queria aquilo pra mim de novo. Não foi fácil, o chão desabou sob meus pés quando tudo começou, e eu me vi sozinha, sem apoio de família e amigos, sem apoio da minha igreja, todos tentavam me convencer a perdoá-lo e diziam que eu tinha que salvar meu casamento, e muitos apoiavam meu agressor. Mas ninguém viveu as humilhações no meu lugar, ninguém sofreu o que eu sofri. Hoje eu aconselho as mulheres vítimas de violência a denunciarem, elas precisam saber que a força vem delas mesmas e dos filhos. Eu consegui ficar viva, dar a volta por cima, criar minha filha e minha vida mudou para melhor, mas infelizmente sei que muitas não tiveram essa sorte”, lamentou C.A.S.

Primeiro ele te bate, depois ele te mata!

B.F., 29 anos, é educadora infantil, casou em 2012 e se separou em março deste ano. Mãe de um filho de 11 anos, do primeiro casamento, ela teve a segunda filha com o então marido e foi onde as agressões começaram. “Ele começou a tratar meu filho diferente, fazia tortura psicológica, ameaçava bater nele. Meu ex estava cada vez mais agressivo, vivia nervoso, ficava bravo por motivos fúteis, dizia palavrões, até que em março último, ele arremessou um prato contra mim, tentando me atingir. Após esse episódio a situação na nossa casa ficou tensa, ele fazia pressão psicológica e era como se eu e meus filhos vivêssemos presos. Ele colocava horário pra tudo e tudo tinha que ser do jeito que queria. Começou a reclamar das minhas roupas, minhas amigas, do jeito que eu falava, e dizia que eu não poderia aparentar ser mais inteligente que ele. Eu vivia retraída e a gente brigava muito. Um dia ele me chamou no quarto das crianças para conversar e lembro como se fosse hoje, queria a separação por conta das brigas frequentes. Concordei e ele pegou uma mala, colocou algumas mudas de roupas e foi embora pra casa da mãe dele, levando o carro e depois voltou buscar a moto. Ficou lá por duas semanas, mas ligava para nossa filha e pedia pra voltar. Porém quando ele foi embora, percebi uma mudança brusca no comportamento das crianças. Era como se estivéssemos livres, eu e meus filhos estávamos felizes. Duas semanas se passaram e ele entrou no apartamento, abriu a geladeira e armários, que eu tinha acabado de abastecer com compras e me perguntou sobre as contas. Falei que tinha pago todas e ele ficou transtornado, não admitia que eu estava me virando bem sozinha, queria me ver sofrendo. Depois me levou até o quarto para conversarmos, meus filhos ficaram na sala, eu sentei na cama e o ele ficou de pé na minha frente. Tenho 1,53m e ele 1,90m e aproximadamente 140kg. Me pediu pra voltar e como não aceitei, ele agarrou no meu pescoço e tentou me enforcar. Meus filhos começaram a gritar, choravam muito e tentaram abrir a porta e ele berrou com eles. Então olhei firme nos olhos dele e disse que se fosse pra me bater, que me matasse. Ele se levantou e foi diretamente para a cozinha, onde pegou uma faca. Agarrei meus filhos e os levei para o quarto deles. Consegui enviar uma mensagem do meu celular para a minha amiga, e foi Deus que fez ela chegar rápido ou eu nem aqui estaria para falar o que aconteceu. Ela tocou a campainha e no mesmo instante ligava para a polícia. Aproveitei a distração dele e pulei a janela com meus filhos, pois moro no térreo”, contou B.F.

Hoje a educadora infantil tem medida protetiva contra o ex-companheiro e ele também não pode chegar perto da filha. O agressor foi preso em flagrante em uma das vezes que foi até a frente do seu apartamento. “Ficou só três dias na prisão e saiu de lá com mais raiva ainda. Então começou a me denegrir para as pessoas e fazer ameaças de morte. Eu e meus filhos tivemos que procurar acompanhamento psicológico. Ligava cerca de 20 vezes ao dia, me ameaçando. Nas primeiras semanas nós três dormíamos na sala, com o sofá encostado na porta, com medo que ele tentasse entrar. Foi aí que ele foi preso novamente e graças a Deus está detido até hoje. Eu e meus filhos estamos tentando nos reerguer, viver em paz novamente. Por isso tudo aconselho as mulheres agredidas por seus maridos, que não retirem as queixas na polícia, não perdoem, não vale a pena, porque primeiro ele te xinga, depois ele te bate e por último ele tenta te matar. Não espere contar com o apoio da família também, porque muitos irão te criticar, chegar ao cúmulo de dizer que você o provocou, irão apoiar teu agressor, então a luta é solitária e exige muita força e coragem”, lamentou B.F.

Texto: Maurenn Bernardo

Publicado na edição 1284 – 21/10/2021

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