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O cotidiano de pacientes que convivem com o HIV

O cotidiano de pacientes que convivem com o HIV

Apesar das incertezas e desconfortos de ter uma doença que pode levar à morte e para a qual ainda não existe cura, pacientes concordam que o tratamento levado à sério é sinônimo de uma vida normal. Quanto ao preconceito e o estigma da doença, eles consideram como obstáculos vencidos. O Jornal O Popular conversou com três pacientes que estão em tratamento de HIV e eles contaram sobre como é conviver com o vírus. Acompanhe os depoimentos.

Lindamar Pereira de Liz, tem 50 anos e trabalha como diarista. Ela descobriu que era soropositivo durante a gravidez da sua filha caçula. Iniciou o tratamento em meio a uma turbulência de problemas, pois já tinha dois 2 filhos que cuidava sozinha e estava grávida de um namorado, porém o casal tinha acabado de terminar o relacionamento. “Terminamos porque ele estava dando em cima da minha filha mais velha, que na época tinha 16 anos. Devido ao susto em saber que estava grávida de 4 meses e ainda ser soropositivo, minha filha nasceu de 6 meses, broncoaspirou, teve sepsie e um derrame cerebral de 3º grau. Segundo o médico, seria uma bebê vegetativa se sobrevivesse, mas acredito em milagres. Hoje ela tem 14 anos não é soropositivo e não tem sequelas”.

O tratamento de Lindamar começou assim que ela recebeu a confirmação. No começo, tomava o coquetel para proteger o bebê e só fazia exames a cada 6 meses, sempre controlando a imunidade. “Dois anos depois o coquetel passou a ser obrigatório para todos os soropositivos. Quase entrei em depressão, porque os remédios me faziam muito mal, até que acertamos um que foi bom pra mim. E após muitas conversas com o médico, entendi que os remédios eram a minha cura. Hoje tomo apenas 2 comprimidos, mas nunca cheguei a ter AIDS, sou soropositivo com carga viral baixa e há mais de 12 anos indetectável.  Minha vida não tem nada de restrito, até esqueço que sou soropositivo e quando falamos em preconceito, não me afeta o que os outros pensam, me importa tudo que passei e o que sou hoje. Sempre que posso tento ajudar outras pessoas quando recebem a confirmação do HIV. E a mensagem que deixo para quem é soropositivo, é que vivam intensamente suas vidas. Ser soropositivo não muda quem você é, apenas te deixa mais forte para descobrir o quanto você é especial para muitos que estão ao seu redor. Aqueles que se afastam, é porque Deus está limpando seu caminho”, diz Lindamar.

Jean Patrick, 35 anos, é enfermeiro, e está em tratamento contra o HIV há 19 anos. Recebeu o diagnóstico em 2004 e iniciou o tratamento em 2006. Naquela época, ainda não era obrigatória a adesão ao tratamento, porém em 2013 a Organização Mundial da Saúde (OMS), entendeu que, por mais que o paciente esteja bem, porém detectável, o mesmo transmite o vírus. Desde então, todos os pacientes, independentemente do quadro clínico, iniciam com a TARV já na descoberta da doença. “Para mim o esquema do tratamento mudou mais ou menos no ano de 2019, eu tomava uma medicação de 12 em 12 horas, ou seja, duas vezes por dia, com o avanço da medicina e das medicações, em uma das consultas rotineiras, o infectologista me propôs a mudança da medicação Lamivudina, Zidovudina e Efavirenz para o 3 em 1, que é uma medicação da mesma família e que tomaria apenas 1 vez ao dia, 1 comprimido apenas, por isso que tem esse nome 3 em 1. Não aceitei no primeiro momento, por medo das reações adversas, somente na terceira tentativa do médico que mudei o esquema (ainda com medo), mas graças a Deus e à medicina, não tive maiores complicações. A única alteração foi no aumento do colesterol e triglicerídeos, pois a medicação altera alguns padrões no sangue”, conta Jean. 

Por conta disso, o enfermeiro diz que está sempre se cuidando na alimentação. “Evito alimentos gordurosos, pois isso atrapalha na absorção das medicações, realizo atividade física, faço uma alimentação saudável e levo uma vida tranquila, esse último quando possível, é claro”, afirma.

Um dos maiores problemas enfrentados pelos portadores de HIV é o preconceito por parte das pessoas. Mas Jean acredita que houve uma evolução nos últimos anos. “O preconceito ainda existe, mas melhorou muito. A educação começa em casa, a escola apenas instrui e auxilia em alguns aspectos, mas na verdade mesmo, o interesse sobre o esclarecimento sobre o assunto tem que partir de cada pessoa. Não adianta falar, falar e falar e as pessoas não quiserem ouvir. Lembro que na Universidade eu fiz um seminário sobre HIV, era uma dinâmica onde eu segurava um cartaz com as palavras: “TENHO HIV-AIDS, VOCÊ TEM CORAGEM DE ME ABRAÇAR?” Muitos ficaram com medo de me abraçar, leram o cartaz e passaram reto. Detalhe: isso aconteceu numa universidade”, ilustrou.

O enfermeiro também faz parte de um grupo de pessoas com HIV. E o fato de trocar experiências com outros pacientes, o encoraja mais. “Existe a troca de experiências e histórias, pois eu encaro o HIV de uma forma tranquila, pois me instruí, li sobre o assunto e só após isso que quebrei meus preconceitos. Nem todos estão preparados ou se preparam para o HIV, neste caso, os grupos vêm para ajudar a todos. Já confortei muitas pessoas que receberam o diagnóstico positivo. Alguns me procuraram para tirar dúvidas, outros para chorar no ombro por terem descoberto o diagnóstico. E a todos eu deixo uma mensagem: Não é o fim. É apenas o início de uma grande história, basta encontrar sentido para ela. Isso vocês podem encontrar na religião, na família, em algum parente próximo, no amor ao próximo. O HIV é o que fortalece as bases comprometidas da vida”.

A.B., 32 anos, preferiu não se identificar, por questões de segurança. Ele descobriu que era portador de HIV em 2018, após um término de relacionamento. Apresentava algumas manchas pelo corpo, perda de peso e fraqueza que o levaram a vários médicos, até que foi encaminhado para o SOA de Araucária e recebeu o diagnóstico. “Hoje o tratamento é super tranquilo, não tenho efeitos contrários e faço apenas consultas de rotina.  Minha carga viral ainda é infectável, então eu levo uma vida normal, porém sempre cuidando da minha imunidade”, comenta.

Para a A.B., o principal motivo que leva as pessoas a terem preconceito é a falta de entendimento sobre o assunto, já que é preciso diferenciar o HIV, que é o vírus, da AIDS, que é a doença. “Quando as pessoas conseguem fazer essa distinção, o preconceito é menor. Ainda assim, vivemos num mundo complicado e nós, portadores de HIV, precisamos estar unidos, sempre trocando experiências, porque isso nos encoraja e dá mais força. As pessoas devem entender que o diagnóstico é apenas um recomeço. A vida não para, conseguimos viver até melhor se fazer o tratamento certo. Então, bora viver, bora reagir, porque somos todos iguais!”, aconselha.

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