As parábolas do Reino de Deus sempre são muito provocadoras e nos apontam o jeito de ser de Jesus e de conduzir a sua vida. Elas são na verdade uma analogia, que tem algo igual mas diferente ao mesmo tempo. Jesus fala que o Reino de Deus é como uma pessoa que está trabalhando a terra, de repente encontra um tesouro. Ela vai então e vende tudo o que tem e compra esse terreno. Ali ela encontrou algo precioso, valioso, incomensurável, que vale a pena se desfazer de tudo para adquiri-lo. Podemos observar que a pessoa não está procurando concretamente esse tesouro, mas, quando o encontra, percebe que ele é o ‘presente’ mais importante da sua vida. Essa parábola quer nos mostrar que o Reino de Deus é um dom, uma graça de Deus. Quando alguém descobre a preciosidade dele, larga tudo o que tem para consegui-lo. Os valores do Reino de Deus não são coisas materiais, de valor consumível, bens temporais, mas, o amor, a justiça, a partilha, a solidariedade, a compaixão, o perdão. Eles nos são dados gratuitamente, e, quando nós os descobrimos, a nossa vida muda radicalmente de direção. Poderíamos resumir tudo em serviço, doação, entrega ao outro. E isso realmente nos realiza plenamente.
O Reino de Deus, por outro lado, é como um comprador que procura pérolas preciosas. Assim como no primeiro caso, quando ele as encontra, vende tudo o que têm para adquiri-las. Nesta segunda parábola percebemos uma diferença, dado que no primeiro caso o homem o encontrou sem estar a sua procura. No segundo caso, ele vai atrás, ele quer comprar, faz o esforço de buscar e faz festa quando as encontra. Ou seja, no primeiro caso o Reino de Deus é dom, é graça, nesse segundo caso, a construção do Reino de Deus requer esforço e empenho. Ele depende de Deus para ser construído, porque é uma graça, um dom seu, mas, também requer a ação da pessoa, o seu esforço, o seu envolvimento, o seu compromisso de arregaçar as mangas e fazê-lo florescer.
São Vicente de Paulo vai dizer que tudo depende de Deus, porque Ele é o Senhor da nossa vida. Mas, por outro lado, ele afirma que requer a força do braço e o suor do rosto. Esperar que Deus faça tudo pode ser cômodo e não acontecer absolutamente nada. Poderemos até culpar a Deus que não ouviu a nossa súplica, mas, esquecemos que a construção depende também do empenho de cada um. Não basta só rezar, assim como, só o esforço humano pode levar a um vazio. São Bento definiu essa dinâmica em duas palavras: ‘ora et lavora’, ou seja, reze e trabalhe. Santo Inácio vai dizer que é preciso fazer todas as coisas como se tudo dependesse de Deus, mas, ao mesmo tempo, como tudo fosse consequência da minha responsabilidade pessoal.
Em tudo isso nós podemos perceber a importância da busca do equilíbrio. Nem só Deus, mas nem só ação humana. Um professor nos meus tempos de estudos em Roma dizia que tudo depende 100% de Deus e 100% homem. E acrescentava: Deus sempre faz a sua parte, mas nós, nem sempre. Essa é a dinâmica do Reino, que se manifesta no ser humano através das suas boas obras. Elas são consequência da graça de Deus, mas, ao mesmo tempo, requerem, exigem o esforço humano. Nem só Deus, mas nem só homem, mas, abrir-se para a graça de Deus, através do empenho humano. Tudo é dom de Deus, mas, tudo pede sempre a colaboração humana.
Edição n. 1373