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Relatos de racismo revelam que o problema está longe de acabar

Descrever o racismo é algo complexo: todo mundo sabe que existe, mas ninguém acha que é racista. O fato é que há 135 anos, o Brasil foi o último país do hemisfério ocidental a abolir legalmente a escravidão com a assinatura da Lei Áurea, em 13 de maio de 1888. No entanto, a lei assinada pela Princesa Isabel não foi capaz de libertar o país da mancha histórica que o racismo representa para a sociedade brasileira.

Tanto que o Brasil é um país onde 56% da população é negra, e a cada ano, os casos registrados de racismo crescem, em 2022, por exemplo, houve um aumento de 50% nos registros de ocorrências de racismo e injúria racial. E não é preciso ir muito longe para ouvir histórias de pessoas que foram vítimas desse preconceito. O Jornal O Popular conversou com três cidadãos negros de Araucária, que relataram suas experiências com o racismo.

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O empreendedor e desportista Luiz Tavares, 62 anos, conta que já enfrentou várias situações de preconceito ao longo da vida. Uma delas, que mais lhe marcou, foi quando uma empresa grande da cidade decidiu contratar seus serviços de pintura de faixas e o convidou para uma visita, no intuito de apresentar pessoalmente o orçamento. “Quando cheguei na empresa para conversar, era um escritório bonito, entrei e o cara foi logo falando que queria conversar com o dono e não comigo. Eu me apresentei, disse que era o Luiz Tavares, proprietário com quem ele havia conversado, e ele não quis acreditar. Depois de tanto eu insistir que era o Tavares, com quem ele havia conversado pelo telefone, ele finalmente disse: ‘deixa quieto, não vou querer o serviço!’. Aquilo foi uma punhalada, pois além de ser vítima do preconceito racial por parte daquele empresário, ainda perdi o serviço, sendo que eu estava precisando muito do dinheiro, estava começando minha empresa. Perdi uma excelente oportunidade de trabalho por conta do preconceito, e demorei anos pra superar aquilo. Hoje sou mais conhecido na cidade, essas situações quase não acontecem mais”, lamentou.

Tavares acredita que hoje em dia as campanhas e ações contra o racismo estão ajudando no sentido de conscientizar mais as pessoas e contribuir com a redução de casos. “Andamos a passos lentos, mas podemos dizer que hoje em dia está mais suportável conviver com isso. Aposto na necessidade de campanhas que ajudem a dar visibilidade para os negros que são exemplos de superação, eles podem servir de inspiração para as gerações futuras, mostrando que o negro pode exercer qualquer cargo público, pode ser engenheiro, doutor, empresário, pode ser o que ele quiser”.

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André Luiz de Oliveira Paganini, 32 anos, é engenheiro civil e também já foi vítima de injúria racial. “Certa vez uma pessoa se referiu a mim como ‘aquele preto’. Estávamos em uma assembleia do condomínio para eleger um novo síndico, e eu era um dos candidatos. A reunião era online e presencial, e uma pessoa que estava no online, cometeu essa injúria com o microfone aberto. Quem estava no presencial não conseguia ouvir o áudio dos participantes online, mas as pessoas que assistiram a reunião me mostraram a gravação depois. Procurei a polícia civil, abri um boletim de ocorrência, fiz uma ata de transcrição do vídeo para apresentar na polícia, mas o caso nunca foi pra frente”, lamentou.

O engenheiro acredita que hoje os casos de racismo estão mais evidentes graças à internet, onde as pessoas compartilham suas experiências. “Esse compartilhamento tem ajudado a repercutir as situações de preconceito, pois se não houver repercussão, o caso não anda”, comentou.

Outra situação vivida por André aconteceu quando ele e a esposa retornavam de uma viagem e pararam em um outlet de beira de estrada. Eles vestiam roupas confortáveis, e em certa loja o segurança passou a acompanhá-lo por onde ia. “Antes de ser pai eu relevava essas situações, mas hoje me pego pensando que não quero que minha filha passe por isso, quero que ela aprenda que isso não está certo, que ela não está errada em ser negra, e que esse tipo de atitude precisa ser combatida. Infelizmente o racismo é cultural, a pessoa não nasce racista, ela se torna. Mas acredito que educação é uma ótima ferramenta pra isso. Esse tema precisa ser debatido com mais intensidade nas escolas, e as consequências para quem comete racismo precisam ser mais expostas, não que isso vá mudar a cabeça ou o pensamento de um racista, mas o fará pensar melhor antes de cometer um ato desses”.

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No dia a dia do trabalho, o guarda municipal Alessandro Rodrigues de Oliveira, 39 anos, nunca sofreu preconceito racial, mas fora dele, já teve experiências negativas. “Fora da corporação vivi situações constrangedoras, algumas delas quando adentrei em certos recintos e percebi um olhar desconfiado por parte do segurança do local. Em uma dessas ocasiões, fiquei bastante nervoso, com vontade de tirar satisfação, porém relevei e entendi que ser agressivo naquele momento não valia a pena me estressar com aquilo”, comentou.

O GM acredita nas campanhas como ferramentas importantes para conscientizar a população contra o racismo, mas sugere que apenas uma educação familiar adequada, com ensinamentos de berço sobre o tema, poderia ser ainda mais eficaz. “Essa educação precisa ser somada a programas também educativos voltados à comunidade escolar, isso poderia acelerar o desenvolvimento intelectual das pessoas e ajudar na mudança de maus hábitos, como ser racista, por exemplo”.

Edição n.º 1390

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