Documento é assinado pela então secretária de Gestão de Pessoas, Rhuanita, e pela diretora geral da época, Rose. Elas dizem desconhecer qualquer tipo de pagamento irregular feito no tempo em que comandavam a pasta
Há algumas semanas, O Popular recebeu em sua Redação – de forma anônima – quatro documentos que, numa primeira análise dão a entender que funcionários da Prefeitura de Araucária receberam por horas extras não trabalhadas.
Nas folhas está elencada uma série de nomes de servidores e, ao lado, a indicação do número ou valores de horas extras que deveriam ser atribuídos a eles naquele mês. Os documentos se referem aos meses de novembro de 2010, e abril, maio e junho de 2011, sendo que todos eles são assinados por quem comandava a Secretaria Municipal de Gestão de Pessoas (SMGP) naquela oportunidade. A relação do mês de novembro de 2010, por exemplo, é rubricada por Rhuanita Graciela Drozd e Rosemari Schuersovski, então secretária e diretora geral da pasta, respectivamente. Já de abril de 2011 é subscrita apenas por Rosemari, assim como a de junho do mesmo ano. Por sua vez, na de maio aparece apenas a rubrica de Rhuanita.
Os indícios de que as horas extras constantes ali foram pagas sem que fossem de fato executadas aumenta quando, em alguns casos, aparece ao lado do nome da pessoa a informação “R$ 300,00 em horas extras além das que vierem da secretaria”. Ou seja, salvo melhor juízo, o que se pode concluir é que, alguém que não o secretário titular da pasta onde o funcionário estava lotado, ordenou que a Prefeitura pagasse horas extras além daquelas apuradas pelo órgão de origem do funcionário.
Também levanta dúvidas o modo como às horas extras estão dispostas nos documentos aos quais O Popular teve acesso. Isto porque ao lado do nome constam dados absolutos sobre o quanto deveria ser pago. Em muitos casos, consta ao junto ao nome do funcionário a inscrição “50% do salário base”, justamente o máximo permitido pela legislação municipal daquilo que se pode pagar ao servidor por horas extras.
Dos nomes que constam da lista, um deles chama a atenção mais do que os outros. É o do servidor Miguel Nunes. Ele é agente de segurança e está licenciado há quase uma década pela Prefeitura à Associação dos Servidores da Prefeitura do Município de Araucária (ASPMA). Nesta condição, ele não poderia receber horas extras, mas recebeu. Seu nome consta da lista como beneficiado com o pagamento de 50% de seu salário base a título desse tipo de vantagem. Questionado sobre o assunto, Miguel confirma que durante toda a gestão passada recebeu horas extras mesmo sem fazê-las. Ele, inclusive, disse que o pagamento era feito mesmo antes de 2009 e só se encerrou em março deste ano. “Desde que fui afastado da Prefeitura e fui para a ASPMA eu sempre tive direito a isso. Desde 2002, antes da aprovação do PCCV, em 2007, aliás, eu recebia até gratificação. Até porque sem essas horas extras não compensa eu ficar como presidente da ASPMA. Tanto é que agora que cortaram, estou pensando em ficar só até o final do ano que vem e voltar para o meu local de trabalho”, relata.
Miguel enfatiza ainda que ao longo das últimas três gestões recebeu as horas extras sem nunca fazê-las e ninguém o questionou por isso. “Não pus a faca no pescoço de ninguém para me pagarem isso. Foram eles (Prefeitura) que assinaram a minha folha de pagamento”, finaliza.
Ex-secretária diz que não vê irregularidades nos documentos
Rhuanita, em primeiro plano. Ao fundo, Rose, ex-diretora de Gestão de Pessoas
Hoje diretora administrativa da Câmara de Vereadores, a ex-secretária de Gestão de Pessoas, Rhuanita Graciela Drosdz, reconheceu sua assinatura nos documentos em poder de O Popular. Ela, porém, afirmou que os papeis deveriam se tratar de relatórios feitos pela SMGP a pedido do então prefeito, Albanor José Ferreira Gomes (PSDB). “Não me lembro especificamente desses relatórios, mas muito possivelmente deve se tratar de algum relatório que fizemos para o Zezé. Quase todos os meses ele nos pedia essas informações, até para poder acompanhar o andamento da folha.
Questionada sobre como a SMGP fazia a apuração das horas-extras dos servidores da Prefeitura, Rhuanita disse que todos os meses as secretarias enviavam relatórios contendo a relação dos funcionários que executaram esse tipo de serviço, sendo que cabia apenas ao setor de RH incluir esses dados no sistema. Apesar de afirmar que a SMGP apenas gerava a folha de pagamento, cabendo as secretarias o controle de quem fez serviço extraordinário, a ex-secretária não soube responder quais as razões de, no relatório assinado por ela, supostamente a pedido de Zezé, constar informações que levam a crer que eram pagos aos funcionários valores além daqueles enviados pelos órgãos de origem dos servidores. Rhuanita afirmou ainda que – enquanto foi secretária – jamais soube de qualquer caso de pagamento a funcionários por horas-extras não realizadas.
Nossa reportagem também entrou em contato com a ex-diretora da SMGP. Por mensagem, ela afirmou que o pagamento de horas extras sempre foi feito de acordo com a solicitação da secretaria de origem e do respectivo ordenador de despesas do funcionário beneficiado.
Documentos foram remetidos para o MP
Tão logo recebeu os documentos que levam a crer que funcionários da Prefeitura receberam irregularmente por horas extras não trabalhadas, O Popular remeteu cópia da papelada ao Ministério Público do Paraná. Recentemente, em contato com o promotor Alexey Choi Carunho, que responde pela Promotoria de Proteção ao Patrimônio Público e à Ordem Tributária, este informou que o expediente estava sendo analisado e que possivelmente seria juntado a outros procedimentos já abertos pelo MP com o mesmo escopo.
Também entramos em contato com o Tribunal de Contas do Estado do Paraná em busca de informações sobre como é feita a fiscalização do pagamento de horas extras feito pelas prefeituras. Segundo a Diretoria de Contas Municipais (DCM), os dados são coletados pelo SIM-AM, sistema utilizado pela Corte para acompanhar a execução financeira dos municípios, porém não existe uma análise sistemática dos gastos com serviços extraordinários de cada prefeitura.
O Popular ainda entrou em contato com o secretário de Gestão de Pessoas da Prefeitura, Rodrigo Maistrovicz Lichtenfels, que informou que a pasta não recebeu até o momento qualquer tipo de denúncia acerca de pagamentos irregulares de horas-extras feitas em qualquer época.