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Professor Rafael de Jesus: A escala 6X1 requer conhecer a história do trabalho
Foto de Lewis Hine.

As últimas semanas foram marcadas por um interessante debate em torno do projeto da deputada do Psol, Erika Hilton, que propõe o fim da escala 6X1, onde você trabalha 6 dias da semana e folga 1, e a adoção da escala 4X3, onde você trabalha 4 dias da semana e folga 3.

Como era de se esperar, mais uma vez, a polarização tomou conta do debate, tornando difícil se estabelecer um diálogo pautado no conhecimento, na razoabilidade e na construção de um Estado de bem-estar social.

Por conta do exposto acima, a História do trabalho, como elemento balizador, ainda não se fez presente no debate público, e isso é muito preocupante.

Para começar, é importante conhecermos a própria etimologia da palavra “trabalho”, que deriva do latim “tripalium”, um instrumento feito de três paus (tri: 3, palium: paus) usado para torturar réus e condenados.

Em termos bíblicos, a primeira vez que o conceito de trabalho aparece, é associado à ideia de castigo. Já no início do livro Gênesis, quando Adão e Eva são expulsos do paraíso, temos a seguinte noção: “maldita é a terra por sua causa; com sofrimento você se alimentará dela todos os dias da sua vida.”

Historicamente essa passagem é conhecida como a “maldição de Adão”. Há até uma trilogia fascinante, do historiador inglês Edward Thompson, chamada “A formação da classe operária inglesa”, onde o volume dois tem exatamente esse subtítulo, a “maldição de Adão”, por tratar justamente das experiências dos primeiros operários dentro e fora das fábricas, nos século XVIII e XIX.

Voltando para a Antiguidade Ocidental, podemos perceber que para os antigos gregos e romanos a ideia de trabalho, especialmente braçal, não era das melhores. Por tratar-se de um modo de produção escravista, trabalhar sempre foi considerado uma atividade depreciativa, sendo que o homem livre deveria dedicar-se às atividades consideradas plenas, como arte, filosofia, política e guerra.

Na Idade Média europeia o que prevalecia era a ideia do pecado original, ou seja, trabalhamos porque pecamos, contribuindo assim para estigmatizar as mulheres, pois foi Eva quem convenceu o pobre Adão a comer o fruto proibido. A ideia central era de que as pessoas, trabalhando com dedicação, poderiam conquistar a salvação eterna.

Foi com a formação dos antigos burgos (cidades), por volta do ano 1000, e o aparecimento dos burgueses, ou seja, dos moradores dos burgos, que a ideia de trabalho começou a ser associada à possibilidade de enriquecimento.

A Reforma Protestante do século XVI, e a criação de igrejas como a Calvinista, contribuíram para se criar uma visão mais positiva do trabalho. Sabe aquelas frases do tipo: “Tempo é dinheiro”, “Deus ajuda quem cedo madruga”, “O trabalho dignifica o homem”, pois bem, elas representam uma nova ética do trabalho, mais positiva, contribuindo para o desenvolvimento do capitalismo.

Com a Primeira Revolução Industrial, ocorrida a partir da segunda metade do século XVIII, e a divisão técnica do trabalho, os trabalhadores perderam o controle sobre os meios de produção, ou seja das máquinas, equipamentos, imóveis e outros, e se viram obrigados a vender sua força de trabalho em troca de um salário.

Naquele tempo, estavam em voga as ideias do liberalismo econômico, defendendo a mínima intervenção no Estado na economia e que as relações entre patrões e empregados deveriam ser resolvidas pela “mão invisível do mercado”. O resultado foi catastrófico, jornadas de trabalho de 16 horas, crianças trabalhando em condições desumanas dentro de fábricas insalubres, mulheres super exploradas por salários aviltantes, e assim por diante.

A promessa era a seguinte: com o desenvolvimento dos meios de produção, impulsionado pelo desenvolvimento tecnológico, com máquinas mais modernas e sistemas mais eficientes, as pessoas poderiam trabalhar menos e ganhar mais. Só que isso não vem acontecendo. Por quê?

Imagem: Crianças trabalhadoras em mina de carvão dos Estados Unidos, década de 1910. Foto de Lewis Hine.

Edição n.º 1442.

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