“Enxuga esse choro. Chorar é coisa de gente fraca. Para com esse mi-mi-mi. Fica aí se vitimizando, parece uma…”
Quantas vezes você já ouviu algo assim? Talvez na infância, talvez na vida adulta. Talvez ainda hoje. Quantas vezes disseram que chorar é para os fracos, que homem não chora, que mulher que chora é dramática demais, uma menininha chorona?

Infelizmente, nossas emoções foram por muito tempo reprimidas e esmagadas por pessoas igualmente feridas, endurecidas pela rigidez dos costumes, robotizadas pela disciplina da sobrevivência. E, assim, pouco sobrou de espaço para a humanização da experiência humana.

Pense: quantas vezes alguém pediu desculpa por chorar diante de você? Quantas vezes você mesmo já se desculpou por deixar as lágrimas caírem?

Mas por que precisamos nos envergonhar de algo tão essencial? O choro é vida que transborda. É o que os olhos derramam quando o peito já não suporta, quando a mente não consegue mais conter. Não à toa, o primeiro sinal de vida de um bebê é justamente o choro. É o som que o médico aguarda para saber se tudo está bem quando chegamos a este mundo.

E, no entanto, quando adultos, esse mesmo sinal vital passa a ser visto como fraqueza. Não é só o choro que é silenciado, mas também os sentimentos, os desabafos, as fragilidades. Criamos um mundo em que precisamos funcionar como máquinas — rápidas, eficientes, frias. Só que nós não somos máquinas.

Somos únicos, insubstituíveis. E quando quebramos, às vezes os danos são irreparáveis.

Não é à toa que, quando alguém desiste da vida, quase sempre ouvimos: “Eu jamais pensei que essa pessoa faria isso, ela nunca deu sinais!”. Mas como poderia dar sinais mais claros, se numa sociedade como a nossa a depressão é condenada, a tristeza é malvista, a fragilidade é escorraçada?

No trabalho, o deprimido é apontado. Se precisa se ausentar para se tratar, é julgado. Nos relacionamentos, muitas vezes é abandonado. Na família, isolado: “Chegou a desequilibrada, vamos mudar de assunto”.

Será que estamos prontos, de fato, para acolher o choro? Para aplaudir aqueles que ainda têm coragem de sentir? Num mundo onde a hipocrisia reina nos feeds, nas novelas e nos casamentos de fachada, a vida real segue sendo muito mais dura, muito mais trágica — e justamente por isso mais verdadeira. Até Jesus chorou!

E, no entanto, o choro dos irmãos é cuspido.

O choro dos gays é tratado como “mi-mi-mi”.

O choro das pessoas negras diante do racismo é visto como vitimismo.

O choro das mulheres que apanham é acusado de falta de fé, de vergonha, de oração.
Será mesmo?

Por isso eu te pergunto: o que você tem feito com o seu choro e com o choro do outro? Do seu irmão, do seu filho, da sua amante, das pessoas da sua igreja, das moças esquecidas nos bordéis ou nas esquinas, que às vezes você paga apenas para te ouvirem chorar ou te emprestar uma peruca?

O QUE TEM SIDO O CHORO PARA VOCÊ?

Acolha. Aplauda aqueles que ainda têm coragem de chorar perto de você. Porque o choro preserva vidas, limpa o espírito e aproxima a humanidade.

Edição n.º 1483.