Ganhou repercussão nacional, e até fora do país, o caso onde juíza atuante na comarca de Tijucas (SC), incentivou criança de 11 anos — que, aos 10, fora vítima de estupro — a desistir de proceder com o aborto.
Analisando a questão legal do caso, o aborto é permitido nos casos em que a gravidez é de estupro ou quando há risco à vida da gestante. Em um terceiro caso, quando há um diagnóstico de anencefalia do feto, o aborto é permitido desde 2012, segundo decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Portanto, nas situações ora apontadas, há o chamado aborto legal.
A juíza de SC agiu auxiliada pela promotoria, cuja função é fiscalizar a aplicação da lei, mas, diga-se, corajosamente a menor afirmou que não desejava ter a criança, que não queria vê-la nascer.
Na quarta-feira, dia 22.06, a procuradora da República Daniele Cardoso Escobar enviou à superintendente do hospital universitário onde se encontrava a menina violentada, uma recomendação para que o estabelecimento cumprisse o que a legislação brasileira determina e realizasse o aborto legal. A menina foi submetida ao procedimento de aborto legal na quinta-feira última, dia 23.06, em Florianópolis.
O que se pode extrair, é que, independentemente das reservas morais que o agente público possa ter relativamente ao conteúdo da lei, deve aplicá-la, dando adequado curso à função que desempenha. O que igualmente se coloca em discussão, são as frases utilizadas e direcionadas à menor, como: “O teu bebê já tá completo. Ele já é um ser humano. Consegue entender isso?”; entre outras tantas, que se abstém de transcrever pela dor e comoção que podem causar ainda mais. Bem como, não se está aqui a discutir a questão moral, mormente religiosa que poderiam inclinar juíza e promotora no caso em comento, mas no que a nossa legislação determina, e que não foi cumprido num primeiro momento.
Frisa-se, portanto, que a Lei está ao lado da criança violentada e da mãe que necessitaram intentar, pelas vias judiciais, o direito ao abortamento. Nessa esteira, urge destacar que o ECA (Lei nº 8.069/90) garante à criança a absoluta prioridade na efetivação dos direitos constitucionalmente considerados como fundamentais, dentre esses a saúde física e psíquica.
Mesmo que não pendesse de dúvida a validade do consentimento e nem houvesse risco à psique da vítima, persistiriam os impactos nocivos da gestação na saúde física da infante.
A condução do caso pela juíza de SC (com participação da promotoria) deu azo à banalização da imagem da mulher. A infante foi despida de valor em si e instrumentalizada para uma finalidade única, que é viabilizar o feto.
Não se está aqui, obviamente, defendendo o aborto, muito pelo contrário! Trata-se sim, de uma violência extrema. Mas não se pode olvidar o direito de uma criança, que deveria falar através de sua genitora, de fazer valer a lei em casos de aborto legal, tal qual se enquadra o caso.
Fica o caso para análise de todos, respeitando opiniões diversas
Publicado na edição 1318 – 06/07/2022