Eparrey Iansã. Senhora dos ventos, dos raios e das transformações que não pedem licença. Dezembro chega tingido de vermelho — vermelho sangue, vermelho vida, vermelho de realeza. Não é cor de enfeite. É cor de força. É devoção a Iansã.

Iansã é celebrada no dia 04 de dezembro em diversos terreiros da Bahia e do Brasil. A data coincide com o dia de Santa Bárbara, figura cristã associada à orixá como estratégia de proteção ao culto do povo preto em tempos de perseguição religiosa.

E é importante dizer com respeito e consciência histórica: Santa Bárbara não é Iansã. Nunca foi. Iansã é africana, ancestral, anterior. Iansã nasce dos Itans — os contos sagrados africanos — e teve presença marcante na região de Oyó, no continente africano. Ela é a personificação feminina da guerreira, da mulher que não espera autorização para existir.

Nas representações de Iansã, ela surge armada. Em uma das mãos carrega o Alfange, a espada que corta ilusões e abre caminhos. Na outra, o Eruexim, instrumento feito com pelos de animais, símbolo do domínio sobre os ventos, as energias e os espíritos.

Iansã governa as mudanças, os deslocamentos, os acontecimentos repentinos. Onde ela passa, nada permanece igual.

As borboletas a acompanham como símbolo da transformação, e o búfalo revela sua força, sua coragem e seu instinto de proteção. E aqui vai um ponto importante:

O acarajé, que muita gente consome sem saber, é comida sagrada de Iansã. É oferenda, é culto, é memória viva do povo preto. Por isso ele é patrimônio cultural tombado na Bahia. Quem não é de religião de matriz africana pode até preparar, mas precisa compreender que não se trata apenas de culinária. É ancestralidade. É respeito.

Muito se fala sobre “filhas de Iansã” como pessoas explosivas, intensas, descontroladas. E aqui eu faço questão de dizer: orixá não é sinônimo de falta de inteligência emocional. Ser filha de Iansã não é justificativa para desorganização emocional, nem substitui terapia.

Orixá revela potência, não desequilíbrio. O que se faz com essa força é responsabilidade humana. Iansã rege verdade, movimento e coragem. Ela não sustenta estagnação, mentira emocional nem relações que aprisionam.

Quando Iansã chega, ela corta, afasta, desmonta e transforma. E tudo o que ela leva é porque já não tinha mais espaço no teu destino. No mês de Iansã, permita-se mudar. Deixe que os ventos levem o que pesa. Deixe que os raios iluminem o que estava escondido. Deixe que a vida se reorganize, mesmo que isso assuste. Iansã não vem para agradar. Ela vem para libertar.

Eparrey Iansã.Que a luz que te conduz seja sempre a sua consciência. Assim seja.

Edição n.º 1496.