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O primeiro artigo da Constituição Federal diz que é do povo que emana todo o poder. Porém, é por meio de seus representantes que esse poder é exercido. Conscientes da lógica do processo eleitoral grupos que visam ter suas causas representadas, se organizam para eleger um dos seus, infiltrar uma de suas sentinelas a fim de guardar seus interesses e evitar o acesso de grupos oponentes. Dessa forma quando os grandes empresários querem avançar em suas demandas eles elegem seus representantes, quando a Igreja quer ver representadas suas pautas ela também elege, e assim fazem os ruralistas, as milícias e outros grupos organizados. E como fica o povo, aquele que se aglomera na parte mais grossa da pirâmide social? Ora, o povo segue elegendo o representante dos outros e por obvio, se sentindo não representado. Do alto da sua nobreza não se envolve em política, pelo contrário, assimila e reproduz a demonização estrategicamente disseminada pelos grupos dominantes.

Há uma insistente prática de criticar o sistema, sem perceber que a população menos favorecida é justamente a parte da engrenagem responsável pela legitimação e manutenção do status quo. Somos parte imprescindível do sistema, somos nós que alimentamos o grande monstro, a força motriz é o nosso recuo, a nossa inércia, ele se nutri do nosso distanciamento, mais que isso, nos usa para eliminar toda e qualquer possibilidade de força contrária, nós mesmos aniquilamos nossos iguais sempre que esboçam a intenção de fugir à regra, de quebrar paradigmas e ocupar os espaços de direito. Criticamos a massa de manobra, mas não nos dispomos a andar ao lado de quem anda na contramão, padecemos da síndrome do caranguejo, puxamos para dentro os que ousam tentar sair da panela quente. Há em nossa camada social um absurdo potencial de desarticulação e autodestruição. É como se negássemos guarida aos nossos pares e entregássemos a chave da própria casa a um desconhecido ou a um ladrão confesso, e depois, ficássemos reclamando do estrago feito em nossa residência.

Já dizia Bertolt Brecht “O pior analfabeto é o analfabeto político”, aquele que se orgulha em se manter distante, que hostiliza novos candidatos, subestima novas lideranças e por fim vota novamente nos mesmos, alegando não ter opção. Outros ainda fazem interpretações equivocadas de recursos como o “voto de protesto” e votam em candidatos sem nenhuma condição de representação, os famosos paraquedistas, aventureiros usados como catalisadores de votos, para depois serem meros joguetes políticos. E dessa forma o poder do povo é outorgado a representantes que representam tudo, menos os interesses da coletividade, a qual segue desassistida. É preciso punir os corruptos, expurgar os usurpadores, mas sobre tudo, ao invés de criminalizar a política, usar o poder que temos para ocupar urgentemente, também esse espaço.

Publicado na edição 1176 – 15/08/2019

Demonização da política, a quem interessa?

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