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A denúncia é importante para frear os casos de violência contra crianças e adolescentes. Foto: divulgação
Pandemia agrava violações dos direitos de crianças e adolescentes
A denúncia é importante para frear os casos de violência contra crianças e adolescentes. Foto: divulgação

A pandemia do novo coronavírus tornou ainda maior o desafio de garantir proteção e direitos básicos para as crianças e adolescentes. O distanciamento social, somado à suspensão de serviços que rotineiramente atendem a esse público, implicou no incremento das subnotificações dos casos de violência. Apesar de considerar a importância que a volta das aulas presenciais escolares neste momento da pandemia, pode colocar em risco a vida da comunidade escolar, é preciso destacar a importância do papel da escola na vida dessas crianças.

Segundo o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em março de 2020, o número de abuso sexuais contra crianças e adolescentes no Brasil aumentou 85% em relação ao mesmo período de 2019. Em abril de 2020, após o afastamento das salas de aula, os números começaram a cair. Entidades que atuam na garantia de direitos das crianças, apontam que os números não significam diminuição na violência, mas o aumento da subnotificação. E um dos motivos que contribuem para isso, são as escolas, em sua maioria, ainda sem aulas presenciais.

O promotor da Vara da Infância e Juventude de Araucária, David Kerber de Aguiar, afirma que a grande maioria dos casos de violência contra crianças e adolescentes ocorrem no ambiente familiar e o distanciamento social imposto pela pandemia, potencializa essa triste condição, seja pelo aumento do período de convivência com o agressor, seja em razão dos serviços que denunciam a ocorrência desses casos, como por exemplo as escolas públicas estarem com as atividades presenciais suspensas. “A escola, além de serviço essencial e vetor de dignidade mínima de qualquer criança e adolescente, é o principal canal de denúncias, sendo que o simples fato de estarmos a quase um ano e meio sem aulas presencias na rede pública, além de prejudicar demais a formação do indivíduo e o estágio de evolução, que não poderá ser reposto sem prejuízos consolidados, fulmina o conceito de proteção integral já que, como dito, o volume de denúncias anterior a pandemia é bem menor, mas obviamente as violações de direitos não diminuíram”, enfatiza.

A conselheira tutelar Patrícia Soares concorda que na pandemia as pessoas passaram a ficar mais em casa, as crianças estão passando mais tempo com os agressores e as violências não estão sendo percebidas pelas famílias.” A falta de um tempo de qualidade com os filhos dentro de casa, de observá-los, é um dos motivos que levam as famílias a não perceberem as violências, mesmo que estejam acontecendo com os filhos. Muitas vezes, diminuem algo que aconteceu, não dando tanta importância para um fato gravíssimo. Por exemplo, um vizinho idoso que apalpou o peito de uma menina de sete anos, ou um adulto que faz brincadeiras de apertar o bumbum da adolescente de 12 anos”, afirma.

Importância da legislação

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que no dia 13 de julho comemorou 31 anos de criação, conta com mais de 260 artigos que regulamentam diversos temas como o direito à vida, à saúde, à educação, acesso ao lazer e proteção contra violência e o trabalho infantil. Mas apesar de ter sido criado há mais de três décadas, o ECA ainda enfrenta muitos desafios, e um deles, na opinião do promotor David, é a necessidade de torná-lo conhecido pela sociedade e da observância obrigatória pelo próprio poder público, não apenas por quem trabalha na área, o que acaba refletindo nas deficiências de sua aplicação. “A política pública quando não conhecida e respeitada, não tem prioridade no investimento de recursos públicos e não há espaço para trabalhar na prevenção e nos direitos com prioridade absoluta. Exemplo disso no município foi a dificuldade em garantir educação infantil para todas as crianças, o que é direito fundamental reconhecido pela Constituição Federal e pelo ECA e que só recentemente vem sendo observado”, observou o promotor.

Quando a eficiência do ECA é colocada em cheque, a possibilidade de uma reavaliação acaba virando pauta. Porém, na visão do promotor, o ECA não necessita de uma reavaliação, uma vez que as críticas sobre a política pública infanto juvenil não se dão no plano da legislação, mas sim de sua não observância. “Os avanços dos últimos anos residem na aplicação efetiva das disposições do ECA e os retrocessos em sua não observância. O que merece reavaliação é a postura dos gestores em não respeitar as disposições do ECA de forma integral”.

Patrícia Soares tem uma opinião diferente a do promotor, ao afirmar que o ECA precisa passar por uma reavaliação. De acordo com ela, a lei é de 1990 e de lá para cá, a sociedade vem evoluindo. “A era digital, os novos modelos de famílias, temas relacionados à identidade de gênero, inclusão, tudo isso faz parte da dinâmica da vida das crianças e adolescentes que devem ter seus direitos assegurados. Algumas alterações já foram feitas, como a Lei Menino Bernardo 13013/2014, mudança da idade mínima para viagem, vagas garantidas a grupos de irmãos na mesma escola. Enfim, como todas as outras áreas do Direito, as mudanças são necessárias de acordo com as demandas da população, e com o ECA não é diferente”, pontuou a conselheira.

Texto: Maurenn Bernardo

Publicado na edição 1271 – 22/07/2021

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