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Rafael de Jesus: Os segredos da erva-mate: parte 1

Os caingangues e tupis a chamavam de congonha, palavra que significa “o que mantém o ser”. Por muito tempo foi assim que os luso-brasileiros se referiam a erva mate, o chá-americano que era consumida pelos indígenas guaranis, caingangues, carijós, xetás, guairás, charruas e até mesmo pelos incas desde tempos imemoráveis.

O próprio termo “mate” tem origem no idioma dos incas, o quíchua, por meio do vocábulo mati, significando “cuia, recipiente” e designando a cabaça na qual até hoje se bebe a infusão de erva-mate. O termo “porongo”, que nomeia a planta que fornece a cuia usada para beber o mate, também vem do quíchua.

Planta nativa de partes dos territórios do Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraguai e Argentina, recebeu o nome científico do Ilex paraguariensis do grande botânico Auguste de Saint-Hilaire em 1820. Não demorou muito para que o cientista-viajante se arrependesse da nomenclatura. Logo descobriu que é aqui, no Paraná, que a planta se desenvolve mais e em maior quantidade. Se retratou dizendo que a planta deveria se chamar Ilex brasiliensis.

No início da colonização, os jesuítas consideravam o mate uma bebida alucinógena, diziam que os indígenas estavam viciados, então proibiram o seu consumo nas missões sob sua administração.

Logo mudaram de ideia por três motivos. Em primeiro lugar porque o consumo do chimarrão combate o alcoolismo que tanto mal causava aos indígenas e colonos. Os religiosos também perceberam que o inverno exigia uma bebida revigorante capaz de aquecer os corpos nas manhãs frias das terras meridionais. Já o terceiro e mais forte motivo veio com o tempo, a comercialização da erva-mate se mostrou muito, muito lucrativa.

Consumida por indígenas, negros, hispânicos e luso-brasileiros em diversas regiões do Brasil, Paraguai, Chile, Bolívia, Argentina e Uruguai, a erva-mate, de um produto de consumo local, se tornou precursora de uma indústria que atende a um amplo mercado internacional.

Aqui nos tempos de Tindiquera, até 1820, a erva-mate era preparada em rústicos pilões de soque por brancos, negros e indígenas, livres e escravizados. Depois era transportada em lombos de mulas pela arriscada serra do mar até o litoral, onde era trocada por produtos necessários à sobrevivência dos nossos antigos moradores.

A partir da década de 1820 modernas técnicas de beneficiamento e comercialização da erva-mate deram novo fôlego ao negócio ervateiro. Os mercados platinos e chilenos passaram a ser atendidos por engenhos de erva-mate construídos em Antonina, Morretes, Paranaguá e Curitiba.

Contudo a falta de uma estrada adequada continuava sendo um problema de difícil solução.

A própria emancipação política do Paraná em 1853 deve muito ao ciclo econômico da erva-mate. Não é por acaso que os brasões do estado passaram a ostentar ramos da erva-mate e do pinheiro. Na natureza as duas plantas estão juntas e a sombra do pinheiro torna a erva-mate mais saborosa.

Em 1873, a conclusão da Estrada da Graciosa deu novo alento ao comércio ervateiro. Carroções passaram a transportar o produto serra abaixo, o produto ganhou em quantidade e qualidade do beneficiamento.

O grande impulso para a economia ervateira estava chegando: a conclusão da estrada de Ferro Curitiba-Paranaguá em 1885. Obra prima da engenharia concebida pelo engenheiro negro Antônio Rebouças Filho, a ferrovia elevou a economia da erva-mate aos patamares de uma verdadeira indústria, capaz de criar a primeira burguesia industrial do Paraná.

Até a década de 1940, a indústria ervateira edificaria fortunas ainda hoje rememoradas por antigas residências em Curitiba, que outrora foram moradas de algumas das famílias mais abastadas da capital.

Continua.

Edição n. 1361

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