O início das aulas deste ano foi diferente nas escolas de todo o país com a nova lei que proíbe o uso de celulares, inclusive em intervalos e nos horários de recreio. A proibição tem por objetivo auxiliar os estudantes a melhorarem sua habilidade de concentração. No Paraná, desde outubro de 2024, já estava em vigor uma regulamentação da Secretaria de Estado da Educação – SEED, que estabeleceu critérios para o uso de aparelhos celulares e outros dispositivos eletrônicos nas escolas da rede pública estadual. A medida foi implementada com o objetivo de garantir o uso da tecnologia utilizada de forma consciente e pedagógica, assegurando a concentração e o bom desempenho dos alunos durante as aulas. Com a recente sanção da lei federal que proíbe o uso de celulares em escolas públicas e privadas em todo o país, o Paraná reforçou os esforços já adotados, restringindo o uso de aparelhos eletrônicos também nos intervalos e recreios.

Não restam dúvidas de que a mudança causou impacto no retorno dos alunos às salas de aula, porém, após três meses em que a medida está em vigor, são perceptíveis as mudanças no comportamento e no convívio entre os alunos. “A medida ainda é muito incipiente, por isso ainda não temos dados pedagógicos concretos que permitam avaliar uma melhora significativa no aprendizado, mas muitos resultados positivos já estão aparecendo”, destaca a SEED.

NOVAS ALTERNATIVAS

Somados três meses sob a nova rotina, em substituição às telas, a rede pública do Paraná adota alternativas mais analógicas, como jogos (tabuleiros, cartas, dados e outros tipos de peças), que não estão decepcionando. Ao contrário, atraem cada vez mais o interesse dos alunos para além do período de descanso entre uma aula e outra. Seja por iniciativa das instituições ou de forma natural.

IMPACTO POSITIVO

Nas escolas da rede particular de ensino do Estado, conforme afirma o Sindicato que as representa – Sinepe/PR, a aceitação da nova lei foi muito positiva por parte das famílias e das escolas, que estão empenhadas em reduzir o uso de telas e promover um ambiente mais saudável para os estudantes. A comunidade escolar reconhece os benefícios da medida, como a melhora na atenção e na interação social, e está colaborando para sua implementação. O período de adaptação foi tranquilo, sem grandes resistências.

“Os estudantes passaram por um período de adaptação natural, no qual gradualmente se acostumaram a não usar os celulares durante o período escolar, especialmente nos intervalos, substituindo esse tempo por interações sociais, práticas esportivas e momentos de descanso. Vale destacar o empenho de diretores, coordenadores e orientadores durante este período, sempre atentos às necessidades de cada estudante e prontos a apoiá-los durante a adaptação”, destaca Celso Hartmann, vice-presidente do Sinepe/PR.

O Sindicato também acredita que a maior atenção dos alunos às aulas ajudará a melhorar os indicadores educacionais, já que em relatórios importantes como o PISA 2022, o uso intensivo de telas por parte de adolescentes aparecia como determinante para a queda no desempenho acadêmico. “Embora ainda seja cedo para dados conclusivos, os indicadores iniciais são promissores. Estudos citados em livros como ‘A Fábrica de Cretinos Digitais’, de Michel Desmurget, mostram que a diminuição do uso passivo de telas está correlacionada com melhores resultados em matemática, leitura e ciências. Além disso, a prática de leitura crítica – em contraponto com a leitura superficial proporcionada pelas redes sociais – e o desenvolvimento do pensamento analítico têm sido favorecidos”, argumenta Hartmann.

O Sinepe/PR ainda aponta que o maior desafio, daqui em diante, não será apenas manter viva a suspensão do uso dos aparelhos, mas, sobretudo, manter viva a reflexão sobre o uso consciente da tecnologia na escola. “Mais do que proibir ou liberar, acreditamos na importância de envolver educadores, famílias e estudantes em um debate permanente sobre os impactos, os limites e as possibilidades pedagógicas do uso dos dispositivos móveis no ambiente escolar. Nosso papel é apoiar as escolas na construção de estratégias equilibradas, coerentes com seus projetos pedagógicos e com a realidade de suas comunidades”, pontua Hartmann.

PREOCUPAÇÃO

Estudos demonstram que a proibição do uso de celulares nas escolas tem efeitos positivos na redução do bullying e na melhoria das interações sociais entre os estudantes. Ao restringir o uso de dispositivos móveis, a escola cria um ambiente onde as interações face a face são mais valorizadas, diminuindo as oportunidades para comportamentos agressivos ou exclusões sociais que frequentemente ocorrem nas redes sociais.

Além disso, quando os alunos não têm acesso aos celulares, eles tendem a se envolver mais em atividades coletivas e jogos ao ar livre, o que favorece a socialização e o desenvolvimento de habilidades emocionais e interpessoais. Essas interações presenciais são extremamente importantes para o crescimento emocional dos estudantes e ajudam a promover um clima escolar mais saudável.

Por outro lado, pesquisas também apontam para o aumento dos casos de violência contra professores e funcionários escolares, e um dos motivos pode ser a proibição do uso de celular. No entanto, ainda é cedo para um diagnóstico conclusivo, visto que a regra está em vigor há três meses apenas.

MAIO LARANJA

Ainda no contexto do uso excessivo de celulares sem supervisão e da violência, a campanha ‘Maio Laranja’ evidencia a importância do combate à exploração e ao abuso sexual contra crianças e adolescentes. Neste ano, o tema da campanha é “Criança segura, futuro garantido”, e alerta para os perigos existentes no ambiente virtual.

O delegado Eduardo Kruger, titular da Delegacia da Mulher e do Adolescente de Araucária, diz que são poucos os casos registrados de abusos praticados através da internet contra crianças e adolescentes, porém é sabido que muitas famílias deixam de registrar os fatos na polícia por vergonha de expor a situação. “Não indicamos isso, pois com o registro, a Polícia Civil poderá chegar ao autor do crime e evitar que ele cometa outros abusos”, indica.

Ainda de acordo com o delegado, os procedimentos de apuração lavrados na Delegacia, relacionados a infrações cometidas por jovens usando a internet, não chegam nem perto de 90%, pois a maioria deles diz respeito a fatos ocorridos no interior ou ao redor das escolas. “No entanto, tirando esses casos, quase todos os demais atos infracionais são praticados pela internet. Há quem pense que a prática de crimes por meio da internet seja uma forma de não ser descoberto pela polícia, mas isso não é verdade. O ambiente virtual deixa muitos vestígios, que hoje estão mais fáceis de serem rastreados, portanto, ainda que se tenha a sensação de anonimato, isso está longe de ser verdade”, alerta.

APURAÇÃO

Segundo a Delegacia, há casos mais simples em que o autor não toma nenhuma medida voltada a ser descoberto, então um simples acesso a rede permite revelar a sua identidade, mas nos casos em que há utilização de perfis falsos, ou mesmo de IPS mascarados com uso de VPN, há técnicas que permitem chegar ao abusador.

“Na minha opinião, para reduzir os casos, precisamos de conscientização por meio de campanhas nas escolas, na mídia e, principalmente, em casa. “Os pais não devem dar nenhuma liberdade para seu filho usar a internet sem o conhecimento deles, afinal, se o jovem não quer revelar o que está fazendo, possivelmente se trata de algo que os pais deveriam saber e tomar providências”, orienta o delegado.

Edição n.º 1464.