Desde quando eu era criança, gostava muito de participar da Igreja. Tinha um prazer enorme de ir com os pais todos os finais de semana para a celebração litúrgica. Entre tantas coisas que me marcaram e, que me levavam a refletir o que aquilo significava, me lembro das intenções que vinham pela ‘conversão dos pecadores’. Quase sempre em cada celebração alguém fazia esse pedido. Confesso que aquilo me deixava um tanto grilado, pois eu não entendia muito bem. É como se aqueles que participavam da igreja já estavam salvos e, enquanto que os outros, precisavam de conversão. Aquilo permaneceu sempre dentro de mim como uma inquietação. A pergunta que sempre pairava no meu interior era essa: mas não somos todos pecadores? A conversão não seria uma exigência diária para cada batizado?
Sim, todos somos chamados à conversão, e o que isso significa? Sobretudo, neste tempo de quaresma é um apelo para cada um de nós, para mudarmos nossa vida, nossas atitudes, nosso jeito de ser. Todos somos pecadores e, diariamente, mesmo sem querer, erramos, falhamos, deixamos de fazer o bem que gostaríamos de fazer e praticamos o mal que tentamos evitar. É nossa condição de humanos, frágeis, limitados, necessitados de uma mudança diária. Não é fácil mudar, principalmente quando nos achamos melhores do que os outros, superiores a eles e, por causa disso, nos colocamos na posição de quase perfeitos e santos. E isso nos leva tantas vezes a nos colocarmos na posição de juízes, que julgam os outros, os acusam e, muitas vezes, ameaçando-os do inferno e da condenação eterna.
O problema tantas vezes está no fato de que não queremos olhar para dentro de nós mesmos e de admitir nossos erros. Torna-se muito mais fácil e menos comprometedor, apontar as falhas dos outros, para esconder e ocultar as nossas. Essa é a primeira grande mudança que deve acontecer com cada um de nós: admitir que somos susceptíveis de falhas, de erros e, humildemente nos colocar na atitude de mudança. Mudar requer muita humildade, porque somos humus, terra, pó, ou seja, reconhecer a nossa fragilidade e pequenez e ao mesmo tempo, acolher o grande e infinito amor de Deus por cada um de nós.
Em uma das suas grandes conquistas, Júlio Cesar, o grande imperador romano, voltou consagrado e tratado como um deus. Alguém então teve coragem e chegou até ele e lhe disse: ‘Júlio Cesar, não esqueças que és apenas um mortal’. É verdade, todos somos mortais e, necessitamos diariamente de conversão. Deus não quer que nos humilhemos no sentido de nos considerarmos um ‘nada’, mas, que reconheçamos que somente Ele é grande e todo poderoso. Nós somos pó e quando aceitamos essa nossa condição, aprendemos a escutar os outros, a nos colocarmos numa atitude de humildade e, deixar de lado o nosso orgulho, a nossa autossuficiência, como se não necessitássemos de nada e de ninguém. Na escola da vida, somos eternos aprendizes e, diariamente, temos tanto a aprender e a mudar. Somente os humildes são capazes de reconhecer suas falhas e mudar de direção. Esse tempo de quaresma nos ensina que grande é aquele que se reconhece o último, o menor, ou seja, aquele que está pronto a servir, a ajudar e não a julgar e condenar.
Publicado na edição 1303 – 22/03/2022