Ser mãe é algo tão maravilhoso que transcende os laços sanguíneos. Para as mães adotivas, essa experiência é ainda mais especial. É o momento em que a mulher faz uma escolha de coragem e amor e abre seu coração para receber uma criança que não nasceu de seu ventre, mas que é esperada com a mesma intensidade e amor.
A mãe adotiva nasce quando o seu olhar se cruza com o do filho que não gerou no ventre, mas que naquele momento já ganha seu coração. Ser mãe adotiva é amar profundamente a vida daquele que chegou pelas mãos de Deus e não da biologia.
Em homenagem ao Dia das Mães, que é comemorado neste domingo, 12 de maio, O Jornal Popular preparou três depoimentos de mães adotivas, que descrevem o que é a maternidade na adoção e contam suas jornadas de coragem, ansiedade pela espera, dedicação e amor intenso.
Rosana de Oliveira Telos é casada há 20 anos com Jefferson Aparecido da Silva, eles são os pais adotivos de Guilherme Telos da Silva. Em meados de 2014, ela descobriu que não poderia ser mãe de filhos biológicos. O casal então tentou a inseminação, mas acabou desistindo no meio do caminho. Foi nesse momento que decidiram adotar uma criança. “Meu esposo conta que desde adolescente já pensava em um dia adotar uma criança. Fizemos uma primeira adoção à moda brasileira, ilegal. Ficamos 29 dias com a criança, porém o juiz a retirou da gente, e é claro, foi completamente correto. Em 2018 entramos com o processo de adoção, fizemos o cadastro na Vara da Infância, tudo como manda a lei. Em 2019, adotamos o Adrian, de 1 ano e 7 meses, um bebê soropositivo. Era uma criança que não ia com ninguém, inclusive a psicóloga do Fórum havia nos alertado sobre isso. Só que quando ele me viu, praticamente pulou do meu colo, foi amor à primeira vista entre nós três, eu, o Adrian, e o meu marido”, relata.
A mãe Rosana conta que quando Adrian tinha três anos, acabou quebrando o fêmur durante um jogo de bola com o pai. Ele ficou 45 dias com gesso. “Passados 15 dias da retirada do gesso, ele começou a ficar com uma cor amarelada, então o levamos ao médico e descobrimos que ele estava com um problema no fígado, provavelmente porque havia tomado remédios muito fortes. O fígado do Adrian deu falência, e como ele era adotivo e tinha HIV, naquele momento não sabíamos o que fazer. Os médicos diziam que seria muito difícil achar um doador, e pra piorar, eu e o Jefferson não éramos seus pais biológicos, então nossa luta começou. Quando começou o tratamento no Hospital Pequeno Príncipe, os médicos diziam que ele só teria 10 dias de vida. Graças a Deus, descobrimos que meu marido era 100% compatível e assim conseguiu doar parte do seu fígado para o Adrian. Ele fez o transplante e teve que ficar internado por cinco meses, aparentemente estava indo tudo bem, até que a médica descobriu que o fígado dele deu rejeição. Em 2022, quando ele completou 4 anos, nós o internamos para fazer outro transplante, mas ele não aguentou e acabou falecendo’, relembra Rosana.
Após a perda do Adrian, o casal chegou a pensar em não ter mais ter filhos, porém a fala de um médico os encorajou novamente. “Ele disse que tudo que fizemos pelo Adrian dentro daquele hospital, todo amor que demos a ele, não viu nada semelhante em muitos pais biológicos. Falou que havia muitas crianças na fila de adoção que mereceriam um amor como aquele que demonstramos ter pelo Adrian. O desejo de ter um filho reacendeu e adotamos o Guilherme em agosto de 2023, ele tinha 11 anos – agora completou 12. É um menino encantador, nós o amamos demais”, diz Rosana, tomada pela emoção.
A história de adoção para o casal não para por aí. Rosana e Jefferson avisam que retornarão para a fila, e dessa querem adotar uma menina. “Amo a maternidade e tive o maior orgulho de ter sido a mãe do Adrian e agora do Guilherme. Tenho certeza que o que sinto por eles é o mesmo sentimento de um filho biológico. Si, foi muito difícil superar a perda do Adrian e hoje não consigo me imaginar sem o Guilherme, ele é a razão de estarmos vivos e lutando para seguir em frente”.
Quase 500 dias de espera
Anielli Garcia Ferreira e Maike Ferreira Sant’Helena também tem uma linda história com a adoção. Eles são os pais da Rebeca Ferreira Sant’Helena. Aguardaram por ela na fila, exatos 470 dias e 67 semanas. “Decidimos pela adoção desde o início do nosso casamento, entramos na fila cerca de 6 anos atrás com o perfil de adotar uma criança de 0 a 13 anos. Depois do nosso cadastro aprovado, começou a ansiedade da espera pela tão sonhada ligação do Fórum. Rebeca veio para nós com 2 dias de vida, fomos buscar ela na maternidade. Foi um momento inesquecível para nós e para nossas famílias, que abraçaram esse sonho conosco”, relata Anielli.
A mãe da Rebeca descreve a adoção como um chamado de Deus e por isso reforça que ser mãe do coração é uma dádiva divina. “Ao invés de um teste de farmácia, foram pilhas de documentos, as ecografias foram substituídas por consultas psicossociais. Choramos, nos alegramos e perdemos, mas não desistimos. Não foram só 9 meses, talvez um pouco mais. Não foi a bolsa que estourou, foi o telefone que tocou, e num piscar de olhos nossa vida mudou. Mudamos as prioridades, as rotinas, reduzimos as correrias diárias, para que a Rebeca tivesse todo o conforto, amor e carinho que todo filho merece. Pensamos em muitos nomes para ela, mas nenhum teve tanto significado quanto o que escolhemos, Rebeca quer dizer ‘aquela que une’. Nós a amamos demais”, declarou Anielli.
Do voluntariado à maternidade
Trabalhando com crianças há cerca de 30 anos, a terapeuta, psicopedagoga e professora Danieli Alexandra Zimermann é casada há 25 anos com Adilso José Ferreira Padilha, eles são os pais biológicos da Laura, de 21 anos, e pais adotivos da Yasmin, de 2 aninhos. O casal se diz apaixonado por crianças. Entre a gestação da filha biológica, perderam outras três gestações, incluindo uma de risco de vida, onde Danieli quase veio a óbito. “As crianças crescem, e nossa filha cresceu. Então começamos a sentir falta de termos mais uma criança para dividir nossos sonhos, nosso dia a dia e as datas comemorativas. E é assim que a história começa: como sempre trabalhei com projetos sociais, acabei conhecendo o Léo, da Família Acolhedora, e em comum acordo demos nosso primeiro passo, que foi acolher uma criança em nossa casa dentro deste projeto. Foi o gatilho, porque tivemos mais do que nunca, a certeza de que seria possível dividir e aceitar o amor de outra criança em nossa vida, que não fosse biológica, independente de cor, idade ou raça”, relata.
Danieli conta que no acolhimento encontrou o amor incondicional por uma menininha de 2 aninhos e quando teve que se despedir dela para sua família adotiva, já que famílias acolhedoras não podem adotar, o coração apertou. “Foi ali que o Léo nos apresentou o Marcelo, da ONG Reencontro, que nos recebeu de braços abertos e nos fez o convite para entendermos um pouco mais sobre adoção”.
O casal se tornou voluntário da ONG e logo iniciou o Curso para Habilitação a Adoção. “Ali começou a ‘gestação’. No curso conhecemos e aprendemos tudo sobre a adoção, sua importância e o quanto isso pode mudar a vida de muitas crianças. Aprendemos sobre como podemos amá-las de qualquer forma, porque elas trazem consigo histórias muito diferentes e na maioria, memórias de agressão, de fome, de lutas e o próprio abandono pelos seus genitores. Vimos que lidar com essas inclusões não seria nada fácil. E claro, aprendemos todo o passo a passo, sobre a documentação para ser levada no fórum, enfim, tudo a respeito do processo de adoção”, diz a terapeuta.
Nesse processo, ele descreve que a ansiedade acontece a todo momento, gera um misto de sentimentos bem característicos de alguém que espera algo, quase que impossível, porque a fila de adoção é lenta, até porque nem todas as crianças que estão na Casa de Acolhimento são aptas para adoção, algumas delas tem a chance de serem reintegradas às suas famílias de origem ou extensas. Aptas para adoção são aquelas crianças que a juíza já determinou a destituição do poder familiar.
Em novembro de 2023, após a entrega da documentação no Fórum, o casal ficou no aguardo das aprovações feitas pela análise dos técnicos judiciários da Vara da Infância. A habilitação veio mais cedo do que imaginavam e em dezembro já entraram para a fila de adoção. O perfil era de uma menina de 0 a 6 aninhos, com doenças tratáveis, de qualquer raça ou cor. Eles também estavam inseridos no CNA (- Cadastro Nacional de Adoção, onde a busca ativa por uma criança é bem constante. Porém nenhuma se encaixava no perfil que procuravam.
“Não desanimamos porque o Marcelo sempre fala durante os cursos que o telefone vai tocar, é o momento em que o Fórum chama o casal com a notícia mais incrível do mundo, dizendo que acharam uma criança baseada no perfil que procuram. Recebemos essa ligação em março deste ano e o coração quase saiu pela boca, foram rios de lágrimas de emoção e quando não acreditávamos, porque nosso perfil é muito procurado, com tempo de espera na fila de 2 a 6 anos, nós finamente conseguimos. Nosso processo saiu rápido, dentro dos trâmites legais e hoje estamos com Yasmin. Ficamos muito felizes pela forma como ela aceitou bem a família”, comemora Danieli.
ONG Reencontro cita quais são os passos legais para a adoção
A adoção é um ato de amor, mas também de muita responsabilidade. É a vida de uma criança que está em jogo, é por ela que os pais adotivos serão os responsáveis. Mas ao decidir pela adoção, a pessoa deve estar ciente de todos os passos legais que o processo implica. O primeiro deles é procurar a Vara da Infância e Juventude do seu Município. Ali vai receber uma lista de documentos para providenciar e é orientada a participar do curso de preparação psicossocial e jurídica para adoção, que é ministrado em Araucária pela ONG Reencontro.
Após participação no curso e a entrega dos documentos solicitados à Vara da Infância, o candidato é submetido a avaliação com entrevistas e visita domiciliar feita pela equipe técnica interprofissional do Fórum. Na ficha de inscrição e também durante as entrevistas técnicas, o pretendente descreverá o perfil da criança desejada. A partir do laudo da equipe técnica e do parecer emitido pelo Ministério Público, o juiz dará sua sentença. Com o pedido acolhido, o nome do pretendente será inserido no Cadastro Nacional de Adoção.
Já na fila para adoção, é preciso aguardar para encontrar uma criança com o perfil compatível. Quando encontrada, a Vara da Infância e Juventude irá avisar o candidato e, se houver interesse, ambos serão apresentados. A criança será entrevistada após o encontro para dizer se quer ou não continuar com o processo. Após esse passo, inicia-se o estágio de convivência. O candidato pode visitar a criança no abrigo, levar para passear para que uma aproximação ocorra. Se o relacionamento correr bem, a criança é liberada e o pretendente ajuizará a adoção. O juiz então profere a sentença e determina a lavratura do novo registro de nascimento.
Sobre a ONG Reencontro
Além de promover o curso para habilitação à adoção, a instituição auxilia os pretendentes à adoção a preencherem os documentos necessários exigidos no processo. Acompanha também os adotantes nos pós adoção, momento em que os pais podem enfrentar alguns desafios. “Existem profissionais capacitados na instituição para poder acompanhar desde o início quando se pensou na ideia até quando a família já está formada”, explica Marcelo Santos, presidente da ONG.
Criada em 2018 para dar apoio a toda rede de adoção em Araucária, a ONG promove ainda o encontro de crianças e adolescentes institucionalizados, legalmente aptos à adoção, com pretendentes habilitados, em um evento chamado “Vidas que se Encontram”.
Para tirar dúvidas dos pretendentes à adoção, a ONG também criou um grupo no Facebook chamado “Adoção Legal”, que atualmente conta com mais de 47 mil participantes. O grupo tem pessoas do Brasil inteiro e de muitos países como Cabo Frio, África do Sul, Itália, Portugal, entre outros. “São pessoas trocando informações sobre o processo, contando sobre como está sendo a adoção para elas, tirando dúvidas, outros dão dicas de filmes e séries sobre adoção. São temas bem diversificados, sempre focando na adoção pelas vias legais”, ilustra Marcelo.