Há alguns dias passei por algo bizarro.

Mandei mensagem para uma amiga — nada de resposta.

Enviei um áudio — nada também.

Depois, um breve puxão de orelha pela demora.

Foi então que o filho dela me respondeu:

“Evandro, ela não está respondendo porque faleceu.”

A gente leva um choque terrível de humanidade numa hora dessas.

Nem sempre ser humano é fácil. Às vezes, parece que seria melhor ser qualquer outra coisa, menos humano. Porque é duro reconhecer que, na nossa espécie, não apenas crescemos e nos fortalecemos — também adoecemos, entristecemos e morremos.

A sociedade cria tantas bolhas, algoritmos e ilusões sobre o que é o “humano ideal”, perfeito, esteticamente simétrico, que esquecemos o essencial: tudo isso é uma miragem coletiva.

E essa miragem nos afasta da verdade mais simples — não estamos brincando de existir. Somos seres fisicamente finitos.

O choque veio quando percebi que minha amiga não iria mais me responder.

Não porque não quisesse falar comigo, mas porque ela morreu.

E essa condição previsível da nossa espécie — a morte — nos deixa permanentemente offline para as redes sociais da Terra.

Naquele instante, eu me senti pequeno.

Encolhi diante da impotência, da irreversibilidade, da dor.

Porque dói admitir que somos vulneráveis.

“Mas você não é espírita?”

Sou, sim. Mas em algum momento você acha que o espírita está super curioso para virar espírito?
De forma alguma.

Preferimos atender o telefone daqui da Terra do que discar de lá pra cá.

O duro é reconhecer que nem sempre teremos de volta a ligação, a vídeo chamada, o abraço, o cheiro das pessoas que amamos.

Minha amiga Vanderleia, no último áudio que me mandou, no dia 27 de setembro de 2025, disse:

“Obrigada, meu amor, por tanto. Por tanto que já passou.”

Ela se referia às vezes em que a ajudei nas dificuldades da vida.

Nem ela imaginava que dez dias depois teria um infarto fulminante.

Nem eu.

Há acontecimentos na nossa frágil vida que são como raios — eles simplesmente caem.

E então não há o que fazer além de chorar, viver o luto, xingar se for preciso.

Eu, por exemplo, ofendi umas três pessoas mentalmente — lembrando das situações humilhantes que minha amiga havia passado em espaços religiosos, com lideranças que deveriam acolher e iluminar, mas a feriram.

Foi meu jeito de lidar com a raiva e a injustiça.

Porque, sim, sou espiritualizado, mas também preciso soltar um palavrão em pensamento.

Não gosto de todo mundo, nem concordo com tudo. E está tudo bem.

“Léia” e eu, tão cedo — espero —, não nos veremos no mesmo plano.

Mas estaremos sintonizados no amor.

Lembrarei sempre do sorriso dela, do jeito de me chamar de “mano”, e de dizer que queria ser como eu: independente de templos e livre de julgamentos.

Não deu pra ser do jeito que ela sonhou, mesmo aos sessenta.

Mas, ao menos, minha amiga, você se livrou do cansaço que é ser forte e brigar contra tudo e todos.

Há momentos em que, quando nossa humanidade sucumbe à casa subterrânea, essa última morada também traz um sentido de liberdade e dever cumprido.

Ser humano é aceitar a frustração das vontades e as limitações do tempo.

A morte da minha amiga me ensinou duas coisas:

Primeiro, sempre diga “eu te amo” ao final de uma conversa com quem você gosta, antes de dizer adeus.

E segundo, nunca perca a chance de ouvir as histórias de quem você ama.

Presença de qualidade é muito mais que figurinhas e emojis.

O offline humano é torturante — um silêncio gritante.

Edição n.º 1487.