O século XIX (1801-1900) foi fascinante, doloroso, assustador, violento, promissor, perturbador, estimulante e repleto de contradições. Para quem viveu no lugar que hoje conhecemos como Araucária, entre 1801 e 1900, a vida não parecia mais se enquadrar aos velhos combinados. Mudanças administrativas, econômicas e do perfil demográfico dessas paragens tornariam o mundo de 1900 irreconhecível para quem por ventura o tivesse visto em 1801.
Nesse período as mudanças administrativas deram novos prestígios à localidade, facilitando a vida dos governantes e massageando o ego da pequena elite local. Tais mudanças estavam intimamente ligadas às transformações políticas vividas pelo Brasil, que da condição de Colônia de Portugal se torna Reino Unido a Portugal e Algarves (1815-1822), depois Brasil Império (1822-1889) e finalmente Brasil República (1889-hoje). Tudo isso em um único século.
Contudo, tanto em Araucária como no resto do Brasil, algumas mazelas deixariam sua triste marca na face do século XIX, sempre chamando a atenção do nosso olhar, sempre nos fazendo relembrar, sempre nos fazendo sofrer.
Em primeiro lugar a escravidão, mal maior do país que se queria civilizado. Vergonha nacional que, além de ter condenado gerações de descendentes de pessoas que foram escravizadas à pobreza e ao preconceito, ainda atrasou todo o desenvolvimento econômico do Brasil, ao diminuir o mercado consumidor (afinal escravizado não recebe salário e, portanto, praticamente não consome) e desestimular o desenvolvimento dos meios de produção, como por exemplo a invenção de novas máquinas.
Livro de assentamento de batizados de filhos de mulheres escravizadas, nascidos na Parochia do Iguassu, a partir da Lei nº 2040 de 28 de setembro de 1871.
Outra triste realidade presente na antiga Freguesia do Iguassú, comum em todo o Brasil, era a relação de dependência dos Caboclos em relação aos poderosos proprietários rurais, senhores dos escravizados e mandatários políticos que mais tarde ficaram conhecidos como Coronéis. Considerados culpados pela própria pobreza e ignorância, os Caboclos se viam à mercê dos poderosos, ora como mão de obra barata, ora como dependentes dos mandos e desmandos dos Coronéis.
Se em 1801 a população da localidade girava em torno de mil almas, em 1900 chegava a 6.870 habitantes. E aqui você deve se perguntar: como pode o número de habitantes ter se multiplicado por mais de seis em apenas um século?
Em grande parte, essa mudança considerável do perfil populacional foi impulsionada pela vinda dos imigrantes, principalmente dos poloneses que aqui chegaram em maiores levas. Há de se considerar também a vinda de outros grupos étnicos não menos importantes à formação do gentílico araucariense, como alemães, judeus, italianos, franceses e outros.
Mais gente e gente mais diversa tornavam a vida mais interessante e complicada. Prova disso eram as constantes tensões e situações de violência com que a população passou a conviver, com muita gente recorrendo às armas, até que a escola, o poder público e a convivência forçada entre os diferentes fossem acalmando os ânimos.
É preciso lembrar, porém, que o século XIX foi um tempo marcante para a história econômica de Araucária. O tropeirismo, a produção de erva-mate, a exploração madeireira e a diversificação da produção interna incentivada pela chegada dos imigrantes, davam novos ares à antiga freguesia.
Podemos dizer que Araucária era o Brasil em menor escala. Estudando a Freguesia você compreende melhor o Império.
Edição n.º 1380